Por Luciana Ramos

 

Uma das estrelas mais brilhantes do star system, Greta Garbo foi trazida da Suécia e moldada com uma aura de inacessibilidade que extravasava seus papéis de mocinhas gélidas. A construção meticulosa de sua persona impedia simples ações como acender um cigarro e a levou, aos 36 anos, a se retirar completamente da vida pública. Sem o reconhecimento da sua fisionomia amadurecida, o publico pôde conservá-la para sempre jovem nas suas mentes.

Seria esta a melhor opção? Tanto do ponto de vista psicológico quanto financeiro, a perda de um objetivo essencial que rege a vida é prejudicial. Por outro lado, a aposentadoria antecipada permite a isenção da série de papéis menores e genéricos a que atrizes hollywoodianas são relegadas, a exemplo das rivais Bette Davis e Joan Crawford, que desceram muito o nível de exigência nas últimas décadas de suas vidas.

Esta questão, tão antiga quanto Hollywood, foi suscitada novamente por Anjelica Huston em uma entrevista recente. Em meio a pedradas disparadas contra Robert De Niro, Jack Nicholson e outros, ela disse sentir vergonha do elenco de “As Rainhas da Torcida” pelo, em suas palavras, “desespero” em aceitarem um papel medíocre, “uma junção pelo último Hurra!”. As suas palavras grosseiras desencadearam respostas do elenco, que enfatizaram a sorte de permanecerem produtivas em Hollywood, símbolo de uma de percepção do valor da terceira idade.

De fato, o filme oferece uma trama mediana e agridoce, voltada em torno da jornada de Martha (Diane Keaton) que, após de desistir do tratamento de câncer, se muda para um lar de idosos. Forçada a escolher um clube para frequentar, ela decide realizar o sonho antigo de ser cheerleader e fundar o próprio. Com a ajuda da sua vizinha, a despojada Sheryl (Jacki Weaver), elas recrutam outras mulheres com a única pretensão de se divertirem e serem felizes.

Os ensaios são malvistos por Vicki (Celia Waston), moradora que se acha dono do espaço, o que causa alguns conflitos menores que giram em torno de uma percepção compartilhada por Huston. A história, torna-se, então, um conto sobre superação de preconceitos e limites, a importância da realização de sonhos em qualquer fase da vida e, em última instancia, a promoção da satisfação pessoal e autenticidade em resposta ao julgamento alheio. O invólucro simplista exime o roteiro de maiores contextualizações (como a situação familiar de Chloe, vivida por Alisha Boe) e aprofundamentos das outras personagens, centrando a narrativa em torno das experiências de Martha, Sheryl e Helen (Phyllis Sommerville), que simbolizam os pontos argumentativos mais importantes.  

Ainda que certamente genérica, a obra consegue cumprir a função de entretenimento leve, muito por conta da união dos comentários politicamente incorretos de Sheryl ao sarcasmo impaciente de Martha, uma amizade baseada em opostos cômicos que funciona muito bem. Há, também, tiradas interessantes sobre a velhice, como os encontros com um grupo adolescente de cheerleaders, além da hilária justificativa para a entrada de Alice (Rhea Perlman) no grupo.

Assim, ainda que não seja nenhum fenômeno cultural, nem de longe, “As Rainhas de Torcida” merece um pouco de apreciação: reúne um grande elenco que, mesmo com melhorias em Hollywood, continua sem ter tantas oportunidades para brilhar – um destino muitíssimo melhor do que o da ermitã Garbo, privada do senso de propósito de uma carreira em tenra idade. Ademais, é importante diferenciar uma comédia boba e alegre como esta das produções em que Robert de Niro, outro citado por Huston, tem se envolvido, dado o tom grotesco de filmes como “Tirando o Atraso” (2016), tipo que Diane Keaton passa longe.

Ficha Técnica

Ano: 2019

Duração: 90 min

Gênero: comédia

Direção: Zara Hayes

Elenco: Diane Keaton, Jacki Weaver, Celia Waston, Rhea Perlman, Pam Grier, Alisha Boe

Trailer:

Imagens:

Avaliação do Filme

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