Por Luciana Ramos
Lee Gates (George Clooney) é o apresentador de um programa de televisão que fala sobre o mercado financeiro, usando o sensacionalismo e a isca do “dinheiro fácil” para atrair espectadores. Após uma das corretoras que premiou como “investimento seguro” despencar inesperadamente, perdendo 800 milhões de dólares em um dia de operação, Gates é sequestrado em pleno ar pelo entregador Kyle Budwell (Jack O’Connell), que exige respostas dele e da empresa.
Do alto da cabine de comando está Patty (Julia Roberts), diretora da programação forçada a transmitir ao vivo os eventos. Ponderada e calma, ela sopra instruções nos ouvidos de Lee enquanto arquiteta com a polícia uma solução para o dilema.
O eixo dramático central está na interação do trio e nos movimentos de poder entre eles. Ainda que esteja com uma arma e um detonador de explosivos nas mãos, Kyle é a pessoa que de fato menos exerce o controle, dada a sua fraqueza emocional, sendo muitas vezes submetido à Lee. Este tramita entre sua personalidade bélica e extravagante, consonante com o tipo de entretenimento que produz, e o fato de estar amarrado a um colete cheio de explosivos. Assim, ele tenta contornar Kyle ao mesmo tempo que exige respostas da IBIS Clear Capital.
Patty, por conta de sua localização e sagacidade manipuladora (também útil para a profissão), parece ser a única a ter uma visão holística da situação. Ainda que temerosa do resultado, ela não deixa de querer tirar o máximo da “oportunidade”, tentando transformar o sequestro em uma atração interessante.
Nessa teia, são tecidas pequenas críticas sobre a moralidade dúbia da mídia e o mercado financeiro atual. Reflexo direto da situação econômica americana pós-crise de 2008, questiona as transações e seus players, mas se aprofunda menos na questão do que poderia.
A acidez de um questionamento aprofundado é substituído pelas pequenas reviravoltas que, embora revigorem constantemente a ação dramática, acabam suavizando a trama como um todo. Assim, “Jogo do Dinheiro” vai paulatinamente tornando-se, ao longo dos seus noventa minutos, um suspense de entretenimento, usando a sustentação crítica apenas como ferramenta de tensão dos personagens.
Esse movimento é ainda mais fragilizado pela tentativa de redimir o seu anti-herói a partir do segundo ato, quando suas ações são constantemente justificadas e atenuadas. A isso, soma-se um final explicativo e demasiadamente simplório, em total contraste a tudo que foi construído ate o momento.
Mas “Jogo do Dinheiro” não é um filme ruim; muito pelo contrário. O humor incutido nas pequenas quebras de expectativas é bem trabalhado, assim como a abordagem humana dos personagens principais. É muito mais interessante aprofundar-nos neles do que de fato tentarmos adivinhar os acontecimentos a seguir, um belo trunfo dada a natureza pouco inovadora do plot.
Esse delineamento é fruto da visão da diretora Jodie Foster, que combina a abordagem dramática a um visual metalinguístico, usando planos mais fechados, movimentações de câmeras atreladas às dos personagens e cortes rápidos, característicos da televisão.
Não se pode ignorar as similaridades entre este filme e as obras de Sidney Lumet, em especial aos excelentes “Um Dia de Cão” e “Rede de Intrigas”. Além da predileção por permear o conflito através dos diálogos, há nas obras de ambos os diretores o tom crítico extensivo à moralidade tanto dos produtores de mídia como dos seus consumidores. Ademais, ao inserir um grito de “occupy Wall Street” em uma cena, Foster aproxima-se de Lumet, que sempre contextualizou suas obras com o fervor americano da época.
Muito do trunfo do longa em conseguir reter o interesse do espectador é fruto das atuações da Julia Roberts e George Clooney, que dominam a cena. Após um hiato, Roberts vem aos poucos reerguendo sua carreira em produções que exploram a sua diversidade, provando mais uma vez neste filme que é uma grande atriz.
Clooney também sofre um processo interessante. Em consequência da predileção exagerada de Hollywood pela juventude, o ator, no auge dos seus cinquenta anos, pôde desprender-se da sua fachada de galã para explorar o seu talento em produções que não se acanham em explorar o seu lado ridículo. Assim como em “Ave, César”, ele mais uma vez parece fazer graça de si mesmo e, no processo, reafirma o seu imenso talento.
O novo filme de Jodie Foster não se sustenta enquanto crítica ferrenha ao sistema financeiro pela forma esparsa e pouco incisiva com que o faz. No entanto, revigora-se como suspense de entretenimento e prova ser um ótimo produto para ser consumido. Vale a pena ser visto.
Ficha técnica
Ano: 2016
Duração: 98 min
Nacionalidade: EUA
Gênero: crime, drama, suspense
Elenco: George Clooney, Julia Roberts, Jack O’Connell
Diretor: Jodie Foster
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