Por Murillo Trevisan
Nove anos se passaram desde a última vez em que acompanhamos as aventuras dos adoráveis brinquedos do Andy nos cinemas. Woody, Buzz Lightyear, Rex, Jessie e toda a turma, nos fizeram acreditar que objetos poderiam ganhar vida e até mesmo uma “sobrevida” após o desapego de seu dono.
Depois de um fechamento – quase que perfeito – do terceiro filme da franquia e, com o anúncio de uma nova continuação, fez nós nos questionarmos se; precisávamos mesmo de mais um “Toy Story”? Segundo Josh Cooley e Jonas Rivera, respectivamente diretor e produtor do filme, sim. Em uma séries de entrevistas, eles ressaltaram o quanto amam esses personagens e que não fariam um nova sequência se não tivessem uma boa história para contar. Mas o que seria tão necessário contar a ponto de arriscar a unanimidade de sua excelência até então?
“Toy Story 4” inicia com um prelúdio passado nove anos antes do terceiro filme, onde Betty (Annie Potts) é vendida e levada para longe dos amigos e de Woody (Tom Hanks), seu grande amor. A cena, ao mesmo tempo em que se vale para justificar a ausência da boneca de porcelana na última aventura, também simboliza a solidão do cowboy, lhe fornecendo as motivações necessárias para o que há por vir.
Seguindo nos dias atuais, em seu novo lar com a Bonnie (Madeleine McGraw), Woody se vê deslocado, uma vez que não é mais escolhido para protagonizar as brincadeiras, sendo substituído – tendo inclusive que emprestar seu distintivo de xerife – pela cowgirl Jessie (Joan Cusack). Amargurado, ele se esconde na mochila da criança que terá de encarar o terror do primeiro dia de aula no jardim de infância. Ela, que enfrenta o mesmo sentimento de rejeição pelos colegas, só consegue se ver feliz e realizada quando – com a ajuda de Woody – cria um novo brinquedo na aula de artesanato, o Garfinho (Tony Hale).
Feito a partir de lixo reciclável, o novo amigo da Bonnie vem a tornar-se um dos plots principais e ganha um grande destaque nessa nova aventura. A rápida transformação, de um monte de restos de materiais em um boneco com vida recebendo desmedido carinho de uma criança, gera uma não aceitação própria, originando em um personagem demasiadamente complexo, em que seu corpo não representa a “quem” ele realmente é. Certificando mais uma vez a sublimidade da Pixar quando o assunto é representatividade.
Em uma de suas crises, Garfinho se perde e vai parar num antiquário sob custódia de Gabby Gabby (Christina Hendricks), uma antiga boneca amargurada e sem voz que sonha obsessivamente em ter uma criança como dona. O resgate dele dá uma nova motivação à Woody para fazer o que de melhor sabe fazer; ajudar os amigos.
Durante o percurso, nosso herói reencontra sua antiga amada Betty. Agora muito mais independente e empoderada, se auto-intitulando como “brinquedo perdido”, fazendo uma clara alusão aos “garotos perdidos” do Peter Pan. Mais uma vez a representatividade entra em cena, reforçando ainda mais a necessidade dessa independência feminina nas histórias, principalmente nas de público infantil.
Como não podia deixar de acontecer em um filme sob o comando da Disney, novos personagens são acrescentados à trama, seja eles utilizados como alívio cômico, como é o caso do Patinho (Keegan-Michael Key) e o Coelinho (Jordan Peele), ou como ganchos emocionais de superação, como o excelente brinquedo dublê Duke Caboom (Keanu Reeves).
Estreante em longas metragens, o diretor Josh Cooley ainda não consegue balancear muito bem uma extensa produção. Apesar de pontos altos e de tamanha sensibilidade ao tratar devidos assuntos, há um desequilíbrio rítmico entre os atos. No primeiro e segundo, o tom remete à uma produção mais simplista – como um dos spin-offs de Natal ou Halloween – deixando o ingrediente secreto Pixar – aquele de partir o coração – apenas para o final do terceiro ato.
Respondendo à pergunta do início, provavelmente não era mesmo necessário uma nova continuação. “Toy Story 4” já nasce em desvantagem, mas mais por conta do filme anterior do que por ele próprio. Mesmo assim, é uma história cheia de coração e emoção, que se viu com a necessidade de dialogar com um público progressista e colocar um novo ponto final nesta trajetória.
Ficha Técnica
Ano: 2019
Duração: 100 min
Gênero: Animação, Aventura, Comédia
Diretor: Josh Cooley
Elenco: Tom Hanks, Tim Allen, Annie Potts, Keegan-Michael Key, Christina Hendricks, Jordan Peele, Keanu Reeves, Joan Cusack