Por Luciana Ramos
Após o crescimento estelar da revolução motorizada, a Ford Motors estagnou na década de 60. Tentou, então, comprar as ações e, por conseguinte, o prestígio da Ferrari. Em resposta, não só foi rejeitada como humilhada publicamente, o que motivou Henry Ford II (Tracy Letts) a inserir sua empresa no mundo das corridas, onde sua rival despontava unânime.
O duelo profissional se consumaria no longo e complicado torneio de Le Mans. Em ampla desvantagem dada a completa ignorância na confecção de carros apropriados para corrida, a Ford contrata Carroll Shelby (Matt Damon) para criar uma máquina apropriada. Este, por sua vez, convoca o temperamental Ken Miles (Christian Bale) para a missão, que disponibilizará tanto os seus dotes de piloto como seu profundo conhecimento de mecânica.
Segue-se então a odisseia destes dois homens, que têm apenas noventa dias para criação de um veículo de ponta capaz de ganhar da experiente Ferrari. Além das extremas dificuldades técnicas – e do perigo inerente à profissão, que desafia constantemente a saúde de Ken – eles são obrigados a lidar com as pressões da diretoria da empresa, revelando assim o verdadeiro mote do filme, o embate talento e burocracia.
O entusiasmo compartilhado de Carroll e Ken por corridas revela-se na imensidão de diálogos altamente detalhados sobre cada aspecto do carro num crescente criativo de alterações a fim de obter o melhor resultado possível. As discussões ou até mesmo altercações físicas servem de reforço da paixão compartilhada pelo tema. Em contraponto, há a apatia arrogante de Ford ou as picuinhas irritantes de seu assistente, Leo Bebbe (Josh Lucas), que atrapalham o processo com suas constantes intervenções e, invariavelmente, prejudicam a dupla de protagonistas.
Os revezes são trabalhados a partir de uma construção simplista e previsível, que aposta na superficialidade como ferramenta de engajamento emocional e é exatamente o escancaramento da sua intenção que torna “Ford vs Ferrari” tão intragável. Seu caráter genérico denota-se na concepção maniqueísta de personagens (na qual o Ebbe de Josh Lucas mostra-se absolutamente risível), na inserção musical, na construção visual das cenas de ação e, não obstante, na caracterização plana da única personagem feminina, Mollie (Caitriona Balfe), relegada ao papel de esposa-que-espera-em-casa.
Como Carroll Shelby, Matt Damon oferece seu carisma habitual (embora não muito mais que isso) e Tracy Letts consegue, por meio da expressão gélida, demonstrar o ressentimento e a sede de poder de um herdeiro milionário que, uma vez desafiado, deseja provar o seu valor. Porém, quem surpreende é Christian Bale e, desta vez, não positivamente. Do sotaque caricato à miríade de expressões exageradas, é chocante observar o descomprometimento de um ator tão talentoso com o papel – única explicação racional para a performance.
Bem produzido e dirigido, “Ford vs Ferrari” é a demonstração de que, sem um roteiro bem fundamentado, mesmo histórias reais inspiradoras podem tornar-se jornadas cinematográficas engessadas e apáticas.
Ficha Técnica
Ano: 2019
Duração: 152 min
Gênero: Ação, Biografia, Drama
Diretor: James Mangold
Elenco: Roberta Sparta, Caitriona Balfe, Christian Bale, Caitriona Balfe, Jon Bernthal