Por Luciana Ramos
O boxe é talvez o principal esporte usado no cinema como ferramenta de superação: em diversos filmes ao longo das décadas, personagens marginalizados sobrepõem as dificuldades pessoais e/ou ambientais no ringue, usando a habilidade física para atingir o sucesso profissional.
A maneira recorrente com que esta fórmula é usada com pequenas variações leva a uma errônea indução sobre “Punhos de Sangue”: que o longa sobre a vida do “verdadeiro Rocky Balboa” será mais um produto derivado de Hollywood sobre o assunto. Porém, o interesse do diretor Philippe Falardeau não está nos méritos do seu protagonista – de fato, estes são reduzidos no roteiro a uma combinação de alguma habilidade com uma propensão fora do normal de apanhar sem cair – mas sim na sua vida após atingir algum sucesso.
A quem encontrasse, Chuck Wepner (Liev Schreiber) prontamente referia-se ao personagem Rocky como a representação de si mesmo nas telonas. Ainda que de fato sua carreira (em especial a luta com Muhammad Ali) tenha inspirado Sylvester Stallone a desenvolver o filme homônimo, notadamente sua vida sofreu a romantização necessária para torná-la uma jornada mais emocionante aos olhos do público. As diferenças, porém, são perdidas para Chuck. Envolto no egocentrismo de sua tímida fama, ele deliberadamente negligencia esposa e filha para jogar-se em um mundo de discotecas, drogas e inevitável decadência. Neste âmbito, é bastante curiosa a sua ingenuidade em esperar da vida o mesmo destino que Rocky teve nos cinemas.
Construído como um verdadeiro perdedor em seu sentido mais amplo, o personagem principal, ainda que cometa seguidos erros de conduta, é filmado sob um olhar afetuoso e leve. As cenas mais dramáticas são suavizadas pelo caráter ridículo de Chuck. Assim, o longa torna-se uma experiência não só palatável como bastante envolvente, ainda que o tom excessivamente romântico do final deixe um pouco a desejar.
Muito do sucesso do filme vem dos esforços de Liev Schreiber dentro e fora das telas, onde atuou como produtor. O ator fornece um painel empático, por vezes bonachão, de Chuck, sem eximir-se de mostrar cruamente seus defeitos. Já Elizabeth Moss supera as expectativas ao retratar o papel clichê de esposa renegada com a energia e raiva requerida, tornando-a complexa e com uma identidade bem delineada, algo raro no tratamento deste tipo de papel.
Esteticamente, o longa não oferece grandes novidades, mas mostra-se competente no retrato da década de 70, desde o figurino à cenografia. Neste sentido, as imagens de arquivo complementam positivamente a narrativa, aproximando-a da realidade.
Unindo passagens absurdas como a que Chuck luta com um urso com outras simples, mas assertivas como a que ele assiste sozinho à cerimonia do Oscar que consagra “Rocky”, “Punhos de Sangue” revela seu tema de forma competente. Fugindo do nível de dramaticidade inerente à maioria dos filmes de esportes, o longa tampouco cai na irrelevância e representa uma agradável mudança à caracterização de boxeadores no cinema, já que se interessa muito mais em explorar sua humanidade fora dos ringues.
Pôster:
Ficha técnica
Ano: 2017
Duração: 98 min
Nacionalidade: EUA
Gênero: biografia, drama, esporte
Elenco: Liev Schreiber, Naomi Watts, Elizabeth Moss, Ron Perlman
Diretor: Philippe Falardreau
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