Por Luciana Ramos
Na última década, o cinema nacional sofreu considerável expansão, mas ainda continua majoritariamente preso a modelos mercadológicos de pouca qualidade, a exemplo das comédias rasas comumente lançadas. No seu sentido oposto está “O Rastro”, claro esforço em explorar um gênero pouco trabalhado no Brasil: o terror. Porém, o longa parece perder-se nas suas habilidades técnicas, deixando de lado a fundamental estruturação narrativa necessária para um filme de sucesso.
A trama acompanha a jornada de João (Rafael Cardoso), encarregado de remover os últimos pacientes de um hospital público sem condições de continuar em atividade para outros estabelecimentos. No último dia de funcionamento, uma garota de dez anos desaparece, atormentando o jovem médico. A contragosto dos seus coordenadores, ele decide conduzir uma investigação sobre o fato. Ao passo que vai descobrindo mais informações, também se vê assombrado pelo fantasma da menina, pondo assim em risco sua sanidade.
O nível de realismo da produção se dá essencialmente pelo fato de ter sido rodado em um hospital abandonado. Os enquadramentos fechados exploram detalhes da deterioração do local, acentuados pelo uso de planos bem abertos, que revelam um mar de equipamentos destroçados e acentuam o nível de medo experimentado.
Somam-se a isso cenas editadas ao inverso de poças de sangue e outros elementos, ferramenta típica do gênero, assim como truques de montagem que tem como claro intuito provocar o susto fácil, conhecido no cinema americano como jump scare. É nesta construção fílmica que surgem aparições fantasmagóricas repentinas, sempre acompanhadas de uma trilha sonora estridente.
Estes elementos somados, ainda que representem um bom domínio da técnica, acabam suprimindo o essencial: o roteiro. Este transita em descompasso entre o apelo sobrenatural, uma trama investigativa e o tom de crítica social, sem conseguir decidir plenamente por um lado. Revela-se, dessa forma, repetitivo e arrastado, sem muito contribuir para o entendimento completo da sua intenção até o final. Quando enfim propõe-se a conectar todos os elementos dispostos na trama, perde-se em explicações e motivações, deixando de lado o nexo casual: é o caso da estruturação ambígua de Ricardo (Felipe Camargo) e a motivação fraca e, portanto, um pouco forçada de Olivia (Cláudia Abreu).
Seus erros narrativos, embora em parte suprimidos pelo sentido geral da trama, são amplamente sentidos e contribuem para a sensação de aleatoriedade. “O Rastro” equilibra-se sob uma fina teia de construção narrativa que se mostra incapaz de trabalhar com profundidade o seu potencial.
A indecisão do tom mostra certa imaturidade em considerar o todo – o filme – ao invés de somente seu lado técnico. Assim, falha em ser um bom exemplo do gênero. No entanto, é importante que este tipo de produção continue a ser encorajada no cenário nacional a fim de oferecer ao espectador maior diversidade de produtos fílmicos.
Pôster:
Ficha técnica
Ano: 2017
Duração: 90 min
Nacionalidade: Brasil
Gênero: terror
Elenco: Rafael Cardoso, Leandra Leal, Cláudia Abreu, Felipe Camargo
Diretor: J.C. Feyer
Trailer:
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