Por Luciana Ramos

 

Analisando os trabalhos anteriores de Martin McDonagh, “Na Mira do Chefe” e “Sete Psicopatas e um Shih Tzu”, nota-se em comum a estruturação do roteiro em torno da violência, que aparece como consequência direta das escolhas iniciais das personagens e irá escalar até o clímax, amarrando assim os temas dos filmes.

 

O mesmo padrão repete-se em sua nova obra, “Três Anúncios Para um Crime”, mas, dessa vez, o seu uso é potencializado como forma de debater conceitos como a intolerância e justiça, explorando seus extremos. O desdobramento dessa escolha narrativa pode ser notado tanto nos embates físicos quanto nos verbais, acentuados pelo tratamento pejorativo usado por todos: a falta de respeito ao próximo aparece como sintoma de cegueira generalizada que impede aquelas pessoas de verem além da superfície.

 

 

O primeiro ato do filme amarra-se em torno da bruta ascensão da violência, provocada pela ideia de Mildred Hayes (Frances McDormand) de externar sua frustração em três outdoors da cidade. Neles, descreve o crime que tirou a vida da sua filha, enquanto exige respostas da polícia local. A atenção indesejada faz a instituição responder a base da força e da ameaça, além de abrir espaço para outros cidadãos não só opinarem sobre o assunto, mas agirem por conta própria.

 

Do incidente envolvendo o dentista local à repreensão a um padre, a protagonista persiste na luta pelo que acredita ser o caminho certo, mesmo nos momentos em que se sente coagida e indefesa, como quando seu ex-marido vem cobrar explicações. De outro lado, Willoughby (Woody Harrelson) tenta redimir a mancha no seu nome enquanto lida com questões pessoais e tenta controlar os ânimos do policial Dixon (Sam Rockwell), que exerce sua profissão com brutalidade.

 

A sucessão de cenas em que as personagens tentam ganhar pelo uso da força ou pela diminuição do próximo torna a experiência de assistir o filme extremamente desconfortável até o seu ponto de virada, quando, aos poucos, o tema aflora e torna-se possível entender as intenções do diretor em arquitetar a história dessa maneira.

 

Se os três anúncios do outdoor atuam como gatilho para o caos, os de Willoughby exercem o efeito oposto, gradativamente apaziguando os ânimos e ampliando a visão das personagens. Nas cartas que escreve para sua esposa, Mildred e Dixon, explicita seus desejos, dúvidas e arrependimentos com extremo respeito a todos eles, provocando uma mudança de tom na trama. Forçando os últimos dois a refletirem sobre as consequências de seus atos, abre espaço para um final pautado na redenção e no diálogo. Cabe ressaltar que é apenas oferecida a indicação de que eles possam, juntos, abraçar um caminho de não-violência, catártico por natureza. Sem fechar questões, o roteiro oferece a decisão ao espectador.

 

 

O trabalho temático é bem balanceado por quebras de expectativas, seja pela inserção de pequenas doses cômicas ou pela exacerbação das atitudes das personagens. Todas essas diferentes gradações são observadas na atuação de Sam Rockwell, que transita entre humor e drama com facilidade, expondo a fragilidade de sua personagem pelo olhar. Seu complemento dramático é Frances McDormand, que oferece uma performance visceral e complexa. Ela mostra-se capaz de encarnar a raiva em seu estado mais puro e, logo em seguida, sutilmente indicar a dor de uma mãe em luto, denotando inteligência e apurado controle das emoções.

 

Trabalhando com a ascendência narrativa, o roteiro de “Três Anúncios Para um Crime” oferece um trabalho temático aprofundado e sagaz. Nas mãos talentosas dos atores, transforma-se em um material fílmico de extrema qualidade, que instiga a reflexão, mostrando-se tão provocador quanto os outdoors de Mildred.

 

Pôster

 

 

Ficha Técnica

 

Ano: 2018

Duração: 115 min

Gênero: drama, crime

Diretor: Martin McDonagh

Elenco: Frances McDormand, Sam Rockwell, Woody Harrelson

 

 

Trailer:

 

 

 

Imagens:

 

Avaliação do Filme

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