Por Luciana Ramos
Em debate seguido da exibição do seu filme na 39º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o diretor Vinicius Coimbra definiu “A Floresta que se move” como uma resposta à polarização nociva do cinema brasileiro, que oscila entre comédias e filmes de arte. Assumindo a pretensão que acompanha a adaptação de um clássico shakespeariano, revelou a sua intenção com a produção: fazer um filme que una os dois lados-comercial e artístico- com roteiro inteligente e atrativo.
Para isso, escolheu transpor para a atualidade à peça “Macbeth”, obra mais adaptada de Shakespeare. Explorando os limites da vileza humana, a trama foca no casal Elias (Gabriel Braga Nunes), executivo importante de um grande banco brasileiro e Clara (Ana Paula Arósio), sua gananciosa esposa.
A estória começa a partir do encontro de Elias e César (Ângelo Antônio), seu colega de trabalho e amigo de longa data, com uma misteriosa bordadeira, que lhe revela uma profecia: ele se tornará vice-presidente do banco no mesmo dia e, em breve, assumirá a posição mais importante da instituição.
Assustado com a sua promoção, confirmando assim as palavras da mulher, Elias comenta o assunto com Clara que, diante a oportunidade, tece um maquiavélico plano: atrair o presidente e fundador do banco, Heitor (Nelson Xavier) para um jantar na isolada casa deles para então matá-lo.
O semblante atônito de Elias logo transforma-se na confiança arrogante proveniente da sede de poder. A dúvida sobre a capacidade de cometer tal ato vai sendo deixada de lado. Muito do seu convencimento vem da persistência de Clara, cuja frieza embebe-se na certeza das vantagens que o crime trará para a vida dos dois.
A investigação policial que se sucede os força a deixar um rastro ainda maior de sangue afim de protegerem-se. Ao passo que Elias ganha pouco a pouco a certeza da sua impunidade diante da sua experiência com o poder absoluto, Clara permanece assombrada pela metafórica mancha de sangue que não sai das suas mãos.
Pautado nos desdobramentos da investigação, o roteiro explora bem os seus personagens principais, a aptidão destes para a crueldade e os efeitos dos seus atos a níveis psicológicos e práticos. Para isso, vale-se da mistura de diálogos da peça original com falas coloquiais, tornando-se assim de fácil assimilação para o público.
Foram inseridos diversos símbolos que não só remetem à obra original como configuram-se como impulsionadores da trama, como a tiara de Clara, a caneta importada e as formigas. Trata-se de uma escolha narrativa muito acertada dada a forma inteligente com que foram trabalhadas. Por conta disso, um certo ar teatral permeia o longa, em especial no seu começo.
A excelência narrativa é acompanhada da primazia técnica, explorada aos mínimos detalhes. Filmado primordialmente no Uruguai, o longa conta com uma belíssima fotografia, que explora as belezas naturais do lugar e concede riqueza estética pelo uso de enquadramentos compostos e jogo entre luz e sombras. A cenografia é igualmente rica e o resultado nas telas é um filme de encher os olhos.
Todo o trabalho narrativo e técnico nada seria não fosse a capacidade dramática de seus atores. Por meio da expressão facial, Gabriel Braga Nunes passa ao público uma gama de emoções que variam desde o medo, arrogância e uma embriaguez vinda da sensação de poder transposta no olhar num excelente trabalho.
Igualmente competente é a interpretação de Ana Paula Arósio, que assimila toda a complexidade da infame Lady Macbeth. Para isso, alia a linguagem corporal a um olhar penetrante e voraz.
Unindo riqueza narrativa e estética, “A floresta que se move” prova o argumento do seu criador: afasta-se do mar de clichês dos filmes comerciais e propõe uma obra inteligente, sofisticada e, ainda assim, palatável. Representante da capacidade artística do cinema nacional, é um longa que merece ser visto.
Ano: 2015
Duração: 95 min
Nacionalidade: Brasil
Gênero: suspense, drama
Elenco: Gabriel Braga Nunes, Ana Paula Arósio, Ângelo Antônio
Diretor: Vinicius Coimbra
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