Por Paulo Lannes
Se fosse um livro, “Ciganos da Ciambra” seria um romance de formação. A narrativa trata da passagem da adolescência para a fase adulta de Pio (Pio Amato), um jovem de 14 anos que vive numa região pobre da Calábria, na Itália. Porém, sendo filme, a obra se encontra repleta de silêncios incômodos: é, antes de tudo, um violento e assustador relato sobre o fim da infância em meio à pobreza e à criminalidade.
Após a prisão de seu pai e de seu irmão mais velho, Pio resolve se tornar o “homem da casa”, vendendo objetos pessoais e participando de roubos. Porém, é tratado por todos como uma criança, condição que o incomoda e o leva a agir impulsivamente – bebendo cervejas, fumando cigarros, transando com prostitutas, saindo de casa de madrugada sem hora para voltar, participando de festas – para conquistar o respeito. Porém, a realidade se mostra cruel e o coloca em situações arriscadas e violentas.
O filme, produzido por Martin Scorsese (“Taxi Driver”) e Rodrigo Teixeira (“Me Chame Pelo Seu Nome”), acerta no uso de planos fechados, sempre centrado no rosto do protagonista, o que provoca uma sensação de sufocamento durante os momentos em que o jovem aparece sendo interpelado por inúmeros parentes barulhentos e bêbados ou em meio à fumaças de cigarro. Além disso, a imagem é polvorenta, remetendo a uma época antiga, como que falasse também sobre a infância de quem assiste a obra.
O filme traz um tema vital para a produção contemporânea: a incapacidade da pessoa em lidar com o meio em que vive. Pio é cigano e nasceu em uma cidade italiana, porém os “italianos” (como ele chama os policiais) são verdadeiros terrores no seu cotidiano. O garoto ama sua família cigana, mas seu amor é respondido por meio de brigas e ordens. Seus parentes odeiam africanos, compostos em grande maioria por imigrantes e refugiados, mas seu melhor amigo é um adolescente negro, nascido em Burkina Faso. Ele ainda gosta de brincar e tem particularidades comuns ao universo infantil, como o medo de andar de trem por serem “rápidos demais”, ao mesmo tempo que tem consciência das dificuldades financeiras e morais que sua família enfrenta diariamente.
Porém, a realidade em que vive põe todas essas questões em confronto e o obriga a se sentir deslocado de seu próprio universo. Não sabe se deve ser adulto ou criança, se deve amar ou odiar, se o que faz é certo ou errado, se provoca orgulho ou decepção. E, muito provavelmente, nunca saberá: não há solidez suficiente neste universo que permita isto. Ele terá que descobrir por conta própria, a partir do que sente dentro de si. Não à toa, torna-se maduro dentro de um trem em alta velocidade, no qual entra sem saber para onde exatamente sendo levado.
Pôster:
Ficha Técnica
Ano: 2018
Duração: 118 min
Gênero: drama
Direção: Jonas Carpignano
Elenco: Pio Amato, Koudos Seihon, Damiano Amato
Trailer:
Galeria de fotos: