Por Marina Lordelo
O primeiro longa-metragem da carreira do dinamarquês Gustav Möller, “Culpa”, passou por Sundance, Rotterdam e diversos festivais europeus e recentemente foi pré-indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Em uma premissa engenhosa e angustiante, o realizador encontra no policial Asger Holm (Jakob Cedergren), que está temporariamente trabalhando como atendente de ligações de emergência, o fio condutor para a narrativa que surge a partir de uma ligação indicando o sequestro de uma mulher.
Há apenas uma locação ambientada em duas salas – a primeira, que o protagonista compartilha com seus colegas, também atendentes, e uma sala exclusiva, onde pode conversar com maior privacidade. Dentro desta lógica, Möller e o diretor de fotografia Jasper Spanning maquinam uma decupagem consciente de poucos planos, na razão de aspecto grandiosa do scope, investindo no enquadramento do “telefone-personagem” que assume, muitas vezes, a responsabilidade de ambientar o imaginário do espectador. Para isso criam também o equilíbrio entre uma luz fria e contínua e seu contraponto escuro e desenhado, marcando os dois únicos ambientes do filme. Mas a equipe técnica consegue ousar com o mínimo disponível: sempre que o telefone é atendido, acende-se uma luz vermelha que comunica ao entorno a ligação em curso; mas essa luz é continuamente ressignificada, reenquadrada e no momento oportuno de recondução do roteiro, assume um protagonismo habilidoso.
Para garantir o clima de tensão que demanda uma obra investigativa e claustrofóbica, o desenho de som discreto e eficiente imerge Asger em profunda angústia. Na tentativa de solucionar o sequestro que lhe é posto, ele precisa escutar os diálogos e sons mais diversos que o telefone disponibiliza, ainda que de forma limitada, o que vem a ser crucial para sua tomada de decisão. O som da delegacia acaba por se misturar aos sons escutados através do telefone, ora naturalistas, ora assumindo o hiper-realismo necessário para o clima narrativo de tensão.
Mas a atuação de Jakob Cedergren estaria comprometida se as vozes projetadas pelo telefone não fossem igualmente habilidosas em garantir ao espectador, tal como ao protagonista, o desespero, o pavor, o alívio e todas as nuances concernentes a história. Ainda que o roteiro oscile na manutenção de energia da trama, coisa que Hollywood faria questão de manter altíssima, os respiros são suficientemente longos para que o próprio espectador consiga relativizar as decisões (aparentemente ineficientes) de Asger.
Möller desafia os limites de imaginação do espectador, dá trabalho ao fotógrafo Jasper Spanning e sua área limitadíssima de trabalho, garante complexidade para a equipe de som, mas também não deixa fácil a tarefa da montadora Carla Luffe Heintzelmann em intercalar planos limitados e sufocantes e os abertos não menos angustiantes. Para um primeiro longa metragem de ex-colegas de faculdade, vale a pena prestar atenção nessa equipe que entra pela porta da frente na cerimônia do Oscar de 2019.
Ficha Técnica
Ano: 2018
Duração: 85 min
Gênero: Crime, Drama, Thriller
Diretor: Gustav Möller
Elenco: Jakob Cedergren
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