Por Luciana Ramos

 

Lançado em 1984, “Caça-Fantasmas” surgiu da junção criativa das mentes de Harold Ramis e Dan Aykroyd, os carismas de Bill Murray e Ernie Hudson e o talento de Ivan Reitman. Seus caminhos se cruzavam em colaborações que definiram a comédia dos anos 80, sempre apostando em personagens desacreditados ou marginalizados que desafiavam a autoridade e demonstravam, de maneira ortodoxa, suas capacidades transformadoras.

Em geral simples, as narrativas apostavam no timing cômico do grupo (que por vezes incluía John Candy ou outros grandes nomes da época) para dar vazão a filmes adorados por serem despretensiosos. Em “Caça-Fantasmas”, os encontros de um estranho grupo de cientistas com fantasmas comilões ou um monstro em forma de marshmallow resumem o tipo de entretenimento que esses comediantes visavam oferecer.

Talvez seja por isso que “Ghostbusters: Mais Além” pareça tão estranho, desconexo. Embora flerte abertamente com a estrutura narrativa do original, o longa preocupa-se demais com o aprofundamento das suas mensagens e, em especial, com a homenagem prestada à figura de Ramis e, no meio, perde boa parte da sua essência divertida.

A trama se inicia com o falecimento de Egon Spengler em circunstâncias misteriosas. Sua filha, Callie (Carrie Coon), herda a fazenda onde ele morava e, prestes a ser despejada, decide se mudar para a pacata Summerville com os filhos para garantir a sua herança. Profundamente ferida pela ausência da figura paterna durante toda a sua vida, ela evita falar dele, mas a adolescente Phoebe (McKenna Grace) começa a encontrar curiosos artefatos pela casa que a levam a investigar o que o avô andava fazendo antes de falecer.

Seu interesse combina com o de Gary Grooberson (Paul Rudd), um professor encarregado de dar aulas durante as férias escolares, mas que está muito mais preocupado em descobrir a origem dos eventos sísmicos que abalam a cidade. Quando o irmão de Phoebe, Trevor (Finn Wolfhard), tem uma desagradável experiência ao visitar uma mina abandonada, o grupo se convence que todos os eventos estão conectados a uma rede sobrenatural que ameaça a vida terrestre. Com a ajuda de Podcast (Logan Kim) e Lucky (Celeste O’Connor), eles planejam concluir o trabalho que Spengler havia se dedicado por tantos anos.

Escrito por Gil Kenan e Jason Reitman e dirigido pelo último (filho de Ivan Reitman, diretor do original), o longa aposta fortemente na nostalgia como ferramenta de sustentação. Além da aparição de todos os objetos de cena originais, incluindo o famoso Ecto-1, há a evidente aposta em elementos típicos dos filmes de aventuras da década de 80, como “Os Goonies” e “Conta Comigo”. Não só o roteiro é pautado na aventura acidental de um grupo de crianças/adolescentes como também pincela nas questões emocionais inerentes à faixa demográfica, como a sensação de não-pertencimento e solidão. Para ficar ainda mais óbvio, há a escalação de Finn Wolfhard, que atua na série “Stranger Things”, para o papel de Trevor.  

O trabalho de remodelar um clássico, por si só, não é um demérito, pois pode acalentar o coração dos fãs originais ao passo que serve para ampliar a base de espectadores para futuras produções. Porém, os criadores de “Ghostbusters: Mais Além” não parecem possuir o bom senso capaz de separar uma obra afetiva e reverenciadora de um produto meramente genérico. Sem parcimônia, a história original é completamente copiada e nem mesmo os vilões ou seus modus operandi são modificados.

A desagradável sensação de déjà vu, quando combinada a uma imposta seriedade que não combina com o perfil do material, tornam a experiência de assistir ao longa mais desafiadora do que o esperado. As pequenas fagulhas de felicidade vêm em doses homeopáticas, sempre por causa de símbolos reciclados. Ao final, o filme investe mais pesadamente na carga emocional, transformando a obra em uma bela homenagem à vida e talento de Ramis.

Apesar de ser comovente, o desfecho ex-machina denuncia o principal problema de “Mais Além”: a sua extrema dependência do original para parecer minimamente interessante. Sem apresentar grandes insights criativos, a produção abre caminho para reconstrução de uma franquia (ignorando a versão feminina de 2016, que tinha muito mais afinidade com o filme de 1984), mas a Sony Pictures pode ter dificuldade em animar os fãs mais aguerridos do clássico a investirem tempo e dinheiro nos vindouros projetos depois de se depararem com a mesmice de sua mais recente investida na franquia dos Caça-Fantasmas.

Ficha Técnica

Ano: 2021

Duração: 2h 4min

Gênero: aventura, comédia, fantasia

Direção: Jason Reitman

Elenco: Carrie Coon, Paul Rudd, McKenna Grace, Finn Wolfhard, Logan Kim, Celeste O’Connor

Avaliação do Filme

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