Por Luciana Ramos

 

Portando chapéu, chicote e uma habilidade sem igual de se safar das situações mais difíceis, Indiana Jones (Harrison Ford) tornou-se um dos personagens mais icônicos do cinema. A trilogia original, dirigida por Steven Spielberg, ajudou a sedimentar o gênero de aventura no gosto popular e afunilar o investimento do mercado cinematográfico em grandes obras que fossem capazes de atrair o público mais abrangente possível.

Em 2008, houve uma tentativa de apresentar um sucessor a Indy na figura do seu filho, Mutt Williams, mas “Indiana Jones e a Caveira de Cristal” mostrou-se aquém das obras anteriores – perdido entre a fina linha que separa ciência e a magia inerente à franquia. Seguiu-se, previsivelmente, uma suspensão de outras sequências, mas, após um hiato de quinze anos, Indiana volta às telonas em uma última aventura.

Desta vez dirigida por James Mangold, o novo filme do arqueólogo pode ser interpretado sob dois prismas diferentes: comercialmente, representa uma época de profunda crise, em que conteúdos não originais são reciclados em detrimento do desenvolvimento de ideias novas; no âmbito criativo, é a oportunidade de um ator veterano de se despedir do personagem que encapsulou tão bem nas últimas décadas.

Temas, simbologias e tipos são reciclados em “Indiana Jones e a Relíquia do Destino”, criando uma dualidade que permeia toda a sua experiência. Por um lado, há o apelo nostálgico, emocional, conduzido pela conexão de Ford ao papel – é um filme competente até certo ponto, oferecendo o descompromisso do embarque em uma aventura com inúmeros desdobramentos nos mais diferentes cenários. Por outro, ele não consegue se igualar ao encantamento visual da trilogia original, em especial no que concerne à direção e design de produção. Seu maior pecado é ser insosso.

A trama oferece um prólogo na Segunda Guerra Mundial, onde apresenta metade de um artefato desenvolvido por Arquimedes que, dizem, poderia ser capaz de moldar o tempo. Para assegurar a sua posse, Jones e seu colega Basil Shaw (Toby Jones) encaram uma trupe nazista em um trem cercado por espólios. Dada a obsessão do amigo pela peça, o protagonista toma a relíquia e promete destruí-la, o que obviamente não faz. Décadas mais tarde, lidando com a dor da perda do filho e a frustração de uma vida chata pela frente (ele acaba de se aposentar), Indiana reencontra Helena Shaw (Phoebe Waller-Bridge), filha de Basil e sua afilhada.

Sem oferecer muita clareza a princípio sobre suas pretensões, ela o força a recuperar o item e seguir em busca da parte faltante. Como de costume, seguem um passo à frente dos vilões – encabeçado pelo cientista Jurgen Voller (Mads Mikkelsen) – ao mesmo tempo que lhes oferecem a trilha do tesouro. Após uma tentativa da mulher de negociar o produto com mercenários e criminosos, o jovem Teddy (Ethann Isidore) soma-se ao estranho grupo de desbravadores que se aventura no mar, ar e terra em busca da relíquia.

A composição de personagens é claramente um aceno ao que deu certo em obras passadas, tanto na dinâmica do “casal” principal quanto na figura do garoto, que lembra o Short Round (Ke Huy Quan) de “Indiana Jones e o Templo da Perdição” (1984). Helena é construída para ser a nova herdeira do posto do aventureiro, servindo como seu contraponto e, portanto, complemento. Ela é despojada e possui um senso de humor/cinismo que se mostra ao mesmo tempo charmoso e um pouco forçado. Seu ponto fraco é exatamente Teddy, que revela ao público uma faceta mais humana. Ela guia o longa-metragem, já que toma as principais decisões e, por ser intempestiva, impele o protagonista a agir para desfazer situações perigosas.

Sob sua asa, o arqueólogo brilha pouco e, quando o faz, é revestido da artificialidade indesejada do CGI, presente no rejuvenescimento forçado (descasado com a voz atual de Ford) e nas passagens que demandam maior esforço físico. “Indiana Jones e a Relíquia do Destino” possui pouco da beleza do design que tornou a franquia tão reconhecida, os labirintos visuais que abrigavam as mais assustadoras armadilhas. Da mesma forma, Mangold, embora saiba conduzir as sequências de ação com dinamismo, não se mostra capaz de criar enquadramentos elaborados, significativos ou mesmo criativos. As sombras das paredes que engradeciam a figura do aventureiro são trocadas por planos óbvios e costurados com montagem conservadora.

O roteiro, por sua vez, caminha bem em linhas gerais, crescendo muito no terceiro ato, quando enfim foca nos desdobramentos da jornada dos personagens principais. Oferece, também, questionamentos pertinentes na contraposição de Jones e Voller: enquanto um deseja controlar o tempo, o outro deseja lhe resguardar e, talvez, se perder nele como forma de superar a dor. Esse tema, ainda que presente em linhas gerais em toda a narrativa, é colocado apenas como pano de fundo, o que não deixa de ser uma pena.

É essa oscilação que permeia todas as principais áreas de produção e se reflete em uma experiência ambígua. Em suma, o filme é mediano, muito acima de “Caveira de Cristal”, longe de ser um fracasso retumbante de esforços, mas bem longe do desfecho que Indiana poderia ter. Deixa, assim, um gosto amargo no final da produção, apontando um esquecimento rápido.  

Ficha Técnica

Ano: 2023

Duração: 2h 34 min

Gênero: aventura

Direção: James Mangold

Elenco: Harrison Ford, Mads Mikkelsen, Toby Jones, Phoebe Waller-Bridge, Ethann Isidore, Shaunette Renée Wilson

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