Mudando de cidade em cidade, sempre ocupando casas deterioradas que foram há muito deixadas para trás, Rex (Woody Harrelson) convence sua família, composta por mulher e três filhos, que a situação é passageira e logo uma bela fundação será erguida no quintal, o que possibilitará a construção de um “castelo” todo de vidro.
É exatamente da fundação familiar que Jeannette (Brie Larson) sente tanta falta. Ainda que ame o pai – o que a torna suscetível à suas histórias mirabolantes – ela acaba sofrendo pela falta de estrutura, rotina e cuidado. Sua experiência na fase adulta mostra bem o embate psicológico da protagonista: de dentro de um taxi, vestida como uma yuppie, avista seus pais revirando os lixos de Nova York. Sua reação é olhar para o outro lado, com vergonha. Como fica bem clara pela estruturação do roteiro, sua escolha de vida, incluindo um relacionamento morno com um analista financeiro, vem da necessidade de pertencimento a um grupo que lhe forneça a segurança que nunca encontrou em casa.
O conflito geracional, acentuado pelos movimentos de encantamento e rejeição, são montados pela inserção de flashbacks da sua infância e adolescência com o rigor técnico que torna transições de cena fluidas. A composição narrativa fornece complexidade aos personagens, tornando suas perspectivas sobre as mesmas situações ao mesmo tempo passiveis de apreciação e questionamento.
Traçando um paralelo entre causas e consequências, algo potencializado pela passagem das crianças pela casa da avó, obtém-se um panorama que se esquiva do superficialismo. As memórias de Jeannette Walls, escritora que remontou seu passado conturbado em um livro autobiográfico, fornecem material para a discussão de um conflito familiar, afetivo, que também é geracional, vindo do embate direto entre os valores em voga na década de 60 e 80, sendo esse construído através da negação do anterior.
Infelizmente, o filme de Destin Daniel Cretton não consegue manter-se alheio à vontade de arrancar lágrimas do público, o que o leva a abraçar o clichê no último ato. Como resultado, há o artificialismo de resoluções mal construídas, aquém ao arcabouço de vivências mostrado até o momento.
Nota-se claramente o amor de Rex pelos filhos, a forma como compensa adversidades financeiras com promessas e o seu empenho em atingir o sucesso sem submeter ao hiperconsumo dos anos 60. Igualmente perceptível é a sua inaptidão em pensar no bem dos filhos em dados momentos, expondo-os a perigos que ainda não estão preparados a enfrentar, como a cena em que tenta ensinar a protagonista a nadar, ou pior: expondo-os à fome por não conseguir controlar seu vício em bebidas.
O nível de detalhe da reconstrução de épocas, a precisão da montagem ou a boa atuação do elenco em geral são méritos que devem ser levados em conta, porém incapazes de explicar o peso emocional do longa. Este deriva-se essencialmente da força com que Woody Harrelson compõe seu personagem. Explorando nuances em uma performance física impactante, ele torna-se o elemento central da obra, a razão maior para assisti-la.
Com o passar dos anos, a protagonista descobre que o castelo de vidro que lhe foi prometido faz parte de uma bela ilusão criada pelo seu pai. A força da descoberta é o gatilho que a faz observar as falhas do seu mundo e sonhar com a segurança em outro lugar. O convívio antagônico na vida adulta, no entanto, a faz refletir sobre o caminho traçado e o papel da figura paterna na sua formação. A mistura das emoções experimentadas é o cerne de “O Castelo de Vidro” que, embora sucumba a alguns clichês, ainda consegue ser um bom filme sobre conflito geracional.
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2017
Duração: 127 min
Gênero: drama
Diretor: Destin Daniel Cretton
Elenco: Woody Harrelson, Brie Larson, Naomi Watts, Ella Anderson
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