Por Luciana Ramos
A proposta de “O Contador” é unir elementos a priori distintos como base para criação de um anti-herói de ação. Para isso, utiliza-se da Síndrome de Asperger, condição que aflige seus portadores pela proveniente dificuldade de interação social, ao passo que os permite desempenhar atividades de alta performance. No caso de Chris Wolff (Ben Affleck), seus conhecimentos matemáticos o conduziram a prestar serviços de contabilidade a criminosos procurados. Seu talento em lavar dinheiro e métodos pragmáticos o tornaram tão conhecido quanto suas habilidades de atirador, transformando-o em um atributo valioso no mundo do crime.
Seu desempenho também desperta a obsessão de um agente do Tesouro Americano, Ray King (J.K. Simmons), que recruta a jovem agente Maybeth Medina (Cynthia Addai-Robinson) para rastreá-lo. Ao mesmo tempo, Chris é contratado por um casal de irmãos (vividos por John Lightgow e Jean Smart), donos de uma prestigiosa empresa de próteses médicas, para avaliar a contabilidade da empresa e achar a fonte de vazamentos recorrentes. Porém, suas descobertas acabam deixando a contadora júnior Dana Cummings (Anna Kendrick) em perigo, o que o força a agir por outros meios.
A trama avança nessas duas frentes, sendo pontuada por flashbacks que oferecem um panorama complexo da criação do contador: o relacionamento abusivo com o pai, que não aceitava sua condição, e seu irmão; o treinamento militar a que foi submetido. A concatenação de tais fragmentos fundamenta o roteiro como uma história de origem que servem para moldar o caráter do protagonista, vendendo sua ideia ao espectador.
Intercalados a esses momentos, apresentam-se cenas de ação que empolgam exatamente por enaltecerem a capacidade técnica de Chris. Somam-se ainda a esses elementos o uso do humor. Bem inserido, deriva-se essencialmente do contraponto entre a necessidade de agradar da personagem de Kendrick com a percepção analítica crua do protagonista.
Cativante até certo ponto, o longa sofre bastante com falhas de roteiro que fragilizam toda a sua estrutura. A maior talvez seja a excessiva conexão dos fatos, trabalhada de tal modo que exige uma suspensão de descrença maior que a habitual. Tal estratégia culmina num incoerente e verborrágico terceiro ato, dando vazão a um anticlímax que poderia ter sido modificado como um todo.
Não obstante, os problemas narrativos são enaltecidos por uma direção apática de Gavin O’Connor, que se preocupa em oferecer apenas o básico. A estética em nenhum momento explora visualmente a peculiaridade do seu personagem principal. De fato, uma abordagem mais dinâmica só é apresentada nas cenas de ação, muito valorizadas pela montagem. A falta de um trabalho mais acurado contribuiu para tornar o filme um produto similar a tantos outros.
Assim, “O Contador” não atinge todo o seu potencial, embora consiga atiçar a curiosidade e prender a atenção. Mesclando bons e maus momentos, alguns beirando a cafonice, oferece um vasto material para futura exploração, abrindo portas para a criação de uma nova franquia de ação. No entanto, para de fato se firmar como um produto de legítimo interesse a longo prazo, necessita trabalhar seus elementos narrativos em uma teia mais coesa.
Ficha técnica
Ano: 2016
Duração: 128 min
Nacionalidade: EUA
Gênero: ação, crime
Elenco: Ben Affleck, Anna Kendrick, J.K. Simmons, Jon Bernthal, John Lightgow, Jean Smart
Diretor: Gavin O’Connor
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