Por Luciana Ramos
A essa altura, Wes Anderson já se tornou um estilo próprio, a ponto de dividir o público de antemão entre fãs e os não entusiastas do seu cinema belo, teatral e infantil (no sentido de brincar, majoritariamente positivo). Os elencos mais e mais densos, assim como suas narrativas, vêm tornando os últimos filmes do cineasta em experiências mais desafiadoras e que, indubitavelmente, separam-se pela capacidade de conexão emocional de cada obra.
O exemplo mais estelar da seara positiva é “Grande Hotel Budapeste”, fabulosamente refinado e, ainda assim, tocante. Do lado contrário, há “A Crônica Francesa”, um filme episódico que se perde em meio à cacofonia de ideias. Devo lamentar que “O Esquema Fenício” se parece mais com o último do que com o primeiro. Este poderia ser cunhado “Uma Aventura Wes Anderson”, já que combina ameaças de morte, granadas, radicais árabes e comunistas a uma narrativa prosaica centrada em uma família disfuncional formada por um magnata, Zsa Zsa Korda (Benicio Del Toro), e seus dez filhos, nove garotos jovens e uma noviça chamada Liesl (Mia Threapleton).
Após a sexta queda de avião, fruto de uma emboscada, Zsa Zsa decide acertar os termos legais para que sua filha mais velha herde todo o seu império (a contragosto), mas antes deve reafirmar os termos do esquema fenício, um elaborado e antiético plano de negócios que incomoda o governo americano. Este persiste em vigiar o bilionário e tentar sabotar o andamento das coisas, mas nem precisa se preocupar muito, visto que cada negociante quer redefinir por si só os termos acordados.

A relação entre pai e filha começa fria e desafiadora, desabrochando-se à medida em que eles mesclam traços de suas personalidades: a noviça ganha uma faca e um terço de pedras preciosas; seu pai ganha um coração. Os dois são acompanhados de Bjorg (Michael Cera), um entomologista com segredos bem guardados e um crush pela jovem religiosa.
A narrativa divide-se em capítulos, sendo cada referente a um sócio com quem Zsa Zsa deve entrar em contato. Embora contenha cenas divertidas, muito ancoradas na comédia visual, o filme não permite que cada personagem respire ou, ao menos, se mostre inteiramente ao espectador, de modo que a sucessão deles chama mais atenção pelo star power (Olhe! Tom Hanks e Bryan Cranston jogam basquete!) do que qualquer tipo de apelo emocional.

Esteticamente magnífico, com quadros pensado em milímetros, o longa engloba as principais ferramentas recorrentes no cinema de Anderson, sempre de maneira muito competente. São comuns intervenções em off, por vezes rápidas e literárias, zooms dramáticos, simetria permanente, efeito luneta e outras gags típicas do cinema mudo. Unidas sob embalagem cômica, elas trazem conforto ao fã do seu estilo, talvez uma apreciação racional dos seus dotes, mas não consegue converter a atenção em catarse – talvez pela quantidade exagerada de subtramas e plot twists, que tornam a apreciação do filme mais uma tarefa do que relaxamento.
Há de se dizer que o elenco está afiadíssimo. Todos parecem incorporar bem os trejeitos típicos das obras de Anderson, e há um trunfo do diretor nessa condução. Destaca-se o trio principal, composto por Benicio Del Toro, Michael Cera e a novata Mia Threapleton. Em ascensão, a filha de Kate Winslet demonstra belo timing cômico e consegue imprimir fisicalidade à sua personagem.
“O Esquema Fenício” traz um cinema divertido, mas hermético e pouco dosado.

Ficha Técnica
Ano: 2025
Duração: 1h 41min
Gênero: espionagem, comédia, ação, crime, drama
Direção: Wes Anderson
Elenco: Benicio Del Toro, Michael Cera, Mia Threapleton, Tom Hanks, Bryan Cranston, Willem Dafoe, F. Murray Abraham, Charlotte Gainsbourg





