Por Luciana Ramos
“Spotlight: Segredos Revelados” surge como um filme fora de sua época. O estranhamento do tom enxuto e sóbrio, um tanto em desuso em tempos de efeitos digitais, alia-se a uma trama simples, sem truques narrativos e reviravoltas desnecessárias, num claro investimento por parte dos roteiristas da atração do público pelo teor da estória contada.
O longa aborda em detalhes os passos da da investigação jornalística feita pelo The Boston Globe que, em 2002, provocou um escândalo nas bases da Igreja Católica ao revelar a prática sistemática de abuso de menores por padres. Ademais, comprovou o conhecimento dos altos escalões da Instituição sobre o fato, que encobria e realocava estes pedófilos no intuito de não manchar a sua imagem sagrada.
Como mostrado no filme, a investigação foi comandada pela equipe especial Spotlight, composta por quatro jornalistas (vividos por Mark Ruffalo, Michael Keaton, Rachel McAdams e Brian D’Arcy James) que representam o caráter absoluto da profissão: ao escolher um tema de estudo, debruçam-se sobre ele durante meses, até o esgotamento do mesmo e consequente reportagem-denúncia veiculada nos jornais impressos do The Boston Globe.
Por encorajamento do novo editor, Marty Baron (Liev Schreiber), decidem olhar mais de perto as pequenas denúncias envolvendo um padre que cometeu abuso sexual contra um menor. Puxando o fio da meada, um caso viram treze, que logo multiplicam-se a números alarmantes com um agravante: o acobertamento na forma de acordos financeiros promovido por advogados que lucravam com os crimes.
Assim, a tensão vai crescendo na medida em que novas descobertas são feitas e o espectador é convidado a participar da investigação. Todos os demais elementos confluem para isso: a fotografia é cinzenta e concisa, assim como a direção. Da mesma forma, o recorte dos personagens expõe a ligação de cada com o caso. Eventualmente, são mostrados em cena detalhes da vida pessoal dos mesmos, mas a trama não se aprofunda nessas questões e, salvo alguns momentos mais marcantes de Mike Rezendes (Mark Ruffalo, indicado ao Oscar de Melhor Ator pelo papel), não oferece demasiado destaque aos componentes da equipe, já que a intenção narrativa é o retrato da investigação em curso.
Dessa maneira, o filme configura-se como descendente direto de “Todos os Homens do Presidente”, filme de 1976 que expõe o caso Watergate. Mais que isso: trata-se de uma homenagem ao jornalismo na sua mais pura forma, embebida pela motivação pessoal do profissional em chegar ao fundo da matéria. Por último, não deixa de ser também um retrato do modo de funcionamento dos jornais impressos, hoje quase que inteiramente soterrados pela mídia digital.
“Spotlight: Segredos Revelados” remonta os bastidores da reportagem ganhadora do Pullitzer que expôs os esforços da Igreja Católica em manter a sua imagem intacta e assim descreditar sistematicamente as vítimas dos crimes cometidos em suas paróquias. Seco, gradual e consistente, não apresenta ao espectador nada além do seu caso-base, o que o torna interessante mas afasta-o da excelência. Ainda assim, pode ser apreciado pela forma com que constrói ao longo de suas duas horas as peças do seu quebra-cabeça, montado e revelado ao final.
Ano: 2015
Duração: 128 min
Nacionalidade: EUA
Gênero: biografia, drama, história
Elenco: Mark Ruffalo, Rachel McAdams, Michael Keaton, Liev Schreiber, John Slattery, Brian D’Arcy James
Diretor: Tom McCarthy
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