Por Marina Lordelo

 

“Um Abraço, Na Sororidade” [Yours in Sisterhood] funciona exatamente como demanda o título: é um abraço aconchegante para qualquer mulher, em qualquer tempo. De forma engenhosa e com um trabalho de pesquisa primoroso, a realizadora Irene Lutsztig, que também é professora da UC Santa Cruz, Califórnia, recolhe mais de 300 cartas de mulheres estadunidenses enviadas a famosa revista feminista Ms., fundada na década de 1970, com uma proposta de acolhimento e endereçamento ao público ativista feminino.

Entre os anos de 2015 e 2017, a equipe transitou pelos estados americanos para filmar mulheres contemporâneas lendo cartas da década de 1970 escritas por mulheres anônimas – e o respectivo efeito que esta leitura causa em cada espectador surpreende pela atualidade dos temas. Um documentário arrojadamente feminino, que mergulha na estratégia do cinema direto como ferramenta de linguagem e de construção de uma narrativa potente, Lutsztig e sua equipe interferem na dose necessária para conduzir as ponderações de suas personagens, seja respondendo perguntas ou realizando questionamentos. Ainda que geralmente fora de quadro, a presença da equipe realizadora é sempre latente, já que, na montagem, a diretora escolhe dilatar o tempo de reação de cada uma destas pessoas pós-leitura.

 

 

E se a montagem é habilidosa em fornecer as reações genuínas do primeiro encontro com as cartas, a fotografia escolhe enquadrar as personagens em um discreto ângulo contra-plongée (aquele de baixo para cima) – e ao passo que engrandece as personas, as coloca falando diretamente para o espectador do cinema, que está localizado na parte mais baixa da tela. Ainda que em quadros parecidos, em sua maioria em plano americano (do quadril para cima), ou em planos aproximados, para gerar empatia, Lutsztig usa a imagem para unir todas as entrevistadas em uma forma lógica e fraterna, e usa o discurso, apenas, como fio condutor das diferenças e das devidas individualidades.

Se há alguma ponderação a ser feita a respeito da proposta narrativa, é o recorte da sociedade feminina de classe média estadunidense, de fato. Ainda que caibam extrapolações para outras comunidades mundiais diversas, os problemas listados são, em sua maioria, de cunho sócio-político definido. E isso fica evidente mesmo quando há diferentes posicionamentos do feminismo levados em consideração, ou, quando uma personagem discorda do argumento da carta que acabou de ler. Há urgências distintas para mulheres africanas, sul-americanas,  asiáticas que, naturalmente, não são contempladas pelas americanas. Apesar de cuidadosamente escolher cartas que posicionem questões “genéricas” e de ampla empatia, o recorte da região e da sua respectiva classe social está evidente na tela. Isso não significa, em hipótese alguma, que não são urgências, ou que não são cosmopolitas. Todavia, o “mundo” Estados Unidos não pode, nem deve, ser levado como uma espécie de consenso universal, que, infelizmente (e discretamente) ignora as consequências do colonialismo e da opressão ostensiva contra mulheres outras.

 

*Esta crítica faz parte da cobertura do VII Olhar de Cinema de Curitiba. O filme ainda aguarda a sua distribuição comercial.

 

Pôster:

Ficha Técnica:
Ano: 2018

Duração: 101 min

Gênero: Documentário / História

Diretor: Irene Lutsztig

 

Trailer: 

Avaliação do Filme

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