Por Luciana Ramos
Em 2006, o documentário “Uma Verdade Inconveniente” abriu uma ampla discussão sobre o aquecimento global, unindo o carisma de um líder engajado – o ex vice-presidente Al Gore – ao senso de urgência da pauta, moldada em uma roupagem didática que simplificava a apreensão dos conceitos técnicos discutidos.
Em meio a gráficos de escalada da temperatura global, somavam-se previsões catastróficas de inundações, terremotos e outros que, invariavelmente, poriam em risco a existência humana a longo prazo. Dez anos depois, uma sequência chega aos cinemas para avaliar os estragos até o momento, ajustar índices e, consequentemente, tentar reviver o engajamento em massa necessário para acelerar medidas publicas proativas.
A cena de abertura de “Uma Verdade Mais Inconveniente” demonstra um grande salto estético em relação ao primeiro filme: a massificação do conceito nesse período ocasionou a bem-vinda substituição de gráficos elucidativos por filmagens de eventos climáticos ao redor do mundo. Uma câmera muito mais aberta mostra em uma grande panorâmica uma área imensa de geleiras derretidas, mescladas com depoimentos de dissidentes que não acreditam no próprio tema.
Tais cenas, impactantes e perturbadoras, atuam bem como oposição aos discursos falaciosos, derrubando-os instantaneamente, além de servirem de complementos aos relatos científicos, políticos e sociais que Al Gore discorre em uma série de palestras onde tenta recrutar pessoas interessadas em espalhar o conhecimento. Sua expertise é facilmente notada no nível de detalhes ao abordar acontecimentos climáticos, na fluidez da sua fala e na assertividade de alguém que trabalhou a vida toda por um ideal.
Afastando-se do problema macro para abordar passagens íntimas e, por vezes, dolorosas do político, o documentário concede um rosto a um conceito tão abstrato, alguém com que uma conexão emocional possa ser facilmente estabelecida, algo que, por sua vez, impulsionará a sua mensagem. Os diretores Bonni Cohen e Jon Shenk dispõem-se a relatar o peso do seu papel, a facilidade com que negocia entre países e corporações na busca por matrizes energéticas limpas. Este é contraposto a um palpável cansaço, o desânimo de alguém que se viu esperançoso por tantas vezes para então sofrer revezes de instituições muito maiores que si.
Seu misto de determinação, esgotamento, resiliência e certa dose de raiva tornam o documentário um relato tão seu, do seu íntimo quanto de uma questão em escala mundial. Porém, ainda que tramite o tempo todo nesse interessante jogo dual, o longa não escapa de parecer excessivamente pesado em determinados momentos, dada a alta carga de informações despejada por minuto.
Um certo frescor é atingido quando enfim a obra se lança para debater possíveis cenários futuros, explorando métodos mais eficientes de acompanhar as mudanças climáticas e iniciativas privadas que incentivam a produção de uma energia limpa. Nesse ponto, a presença de Al Gore como um interlocutor poderoso do assunto é reiterada pela sua participação ativa no firmamento do Acordo de Paris. Como um jogo de ações e reações, o documentário termina com a mensagem que o presidente do seu país, Donald Trump, retirou os Estados Unidos de tal acordo, eximindo-se a cumprir suas determinações.
A passos inconstantes em ziguezague, a questão climática avança no mundo. “Uma Verdade Mais Inconveniente”, no entanto, recusa-se a terminar em tom sombrio: a esperança, na visão de Al Gore, está na expansão da mensagem através do recrutamento de pessoas interessadas em combater o aquecimento global, tanto a nível individual quanto através da pressão comunitária em torno dos seus líderes.
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2017
Duração: 98 min
Gênero: documentário
Diretores: Bonni Cohen, Jon Shenk
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