Por Luciana Ramos
Ao ser lançado no longínquo ano 2000, “X-Men” redefiniu os padrões das adaptações cinematográficas de HQs por unir cenas de ação visualmente atrativas com um tratamento humanizado de seus personagens. Cada mutante tinha suas motivações bem trabalhadas e sofria de uma forma peculiar pelos seus poderes. Debates sobre preconceitos e intolerância também eram postos como pano de fundo das primeiras tramas, concedendo maior substância a esses filmes.
Dezesseis anos depois, chega aos cinemas o sexto longa da franquia (sem contar os filmes solo do Wolverine) com conteúdo bastante esvaziado. Questionamentos existenciais que aparecem nos dilemas enfrentados por Ciclope (Tye Sheridan) e Jean Grey (Sophie Turner) são logo deixados de lado em uma trama que privilegia ação histriônica comandada por um vilão que não convence. Aparentemente desesperado em satisfazer o público com sequências de lutas, o diretor Bryan Singer abandona aspectos importantes do desenvolvimento narrativo, transformando o que poderia ser um ótimo filme em um produto regular, pronto para ser consumido e rapidamente esquecido.
A começar, os discursos grandiloquentes e vazios tornam o seu vilão, Apocalipse (Oscar Isaac), um tanto cartunesco e, consequentemente, pouco crível. Tal falha, aliada a uma maquiagem pesada e claramente artificial, tornam a tarefa de enxerga-lo como uma ameaça difícil. En Sabah-Nur tem a sua história revelada logo ao começo: o primeiro e poderoso mutante foi cultuado como um falso Deus na antiga civilização egípcia e, após uma traição, teve seu corpo preservado para então voltar à vida nos dias atuais.
Determinado a exterminar a raça humana para comandar um mundo exclusivamente composto por mutantes, sai a procura de cavaleiros que o possam ajudar na empreitada. Com isso, recruta Psylocke (Olivia Munn), Tempestade (Alexandra Shipp), Anjo (Ben Hardy) e Magneto (Michael Fassbender). Apocalipse visa os poderes de Xavier (James McAvoy), pois acredita esta ser a chave para concretude do seu plano. Caberá então a Mística (Jennifer Lawrence), O Fera (Nicholas Hoult), Noturno (Kodi Smit-McPhee), Mercúrio (Evan Peters), Jean Grey e Ciclope acharem uma forma de destruir o poderoso mutante antes que ele ponha em risco toda a humanidade.
A trama é prejudicada pelo seu mal desenvolvimento, o que compromete o apelo emocional necessário nesse tipo de produção. As motivações de Apocalipse, por exemplo, não são bem arraigadas e resultam na fragilidade dramática que permeará todas as ações decorrentes. Isso é sentido especialmente na conexão dos quatro cavaleiros com o seu mestre: Tempestade e Arcanjo aceitam participar do plano sem pestanejar, ao passo que os roteiristas nem parecem se importar em desenvolver Psylocke, que mal fala em duas horas e meia de filme e cujas justificativas jamais são explicadas. O único que escapa dessa sina é Magneto, que ganha mais uma vez uma história de origem para justificar o interminável jogo de mudança de atitude em relação aos humanos.
Do outro lado, o personagem que mais sente pela pobreza de representação é o Noturno, cuja religiosidade (sua característica mais marcante) é simplesmente jogada em determinada passagem. Por outro lado, Ciclope e Jean Grey, como já explicitado, ganham boas introduções e maior nível de aprofundamento. A opção de trazer rostos novos a mais recente franquia revelou-se muito positiva por conceder frescor ao universo, em especial pelo fato de jovens não se restringirem suas vidas à escola do Professor X.
O maior destaque, no entanto, continua sendo Mercúrio, talvez o mais bem explorado dentre todos os mutantes. Repetindo a fórmula de sucesso do filme passado, “X-Men: Apocalipse” explora seus poderes na melhor sequência do longa, que oferece ao espectador o tipo de entretenimento puro que este merece.
O filme também regozija-se em algumas passagens empolgantes envolvendo os mutantes mais poderosos. Nesse contexto, destacam-se as cenas de ação, onde todos os recursos gráficos possíveis são utilizados para reter a atenção do espectador. Bem estruturadas, estas atuam como um fan service, mas não são capazes de oferecerem a coesão necessária para a trama.
Assim, ao final de suas duas horas e meia, “X-Men: Apocalipse” não se revela como um filme ruim no seu todo, mas demasiado irregular e, por isso, aquém das expectativas. Uma vez inovadora, a franquia caiu na previsibilidade das fórmulas que ela mesma ajudou a propagar e, com isso, não parece tão relevante se comparado a outras produções do mesmo subgênero. Seu maior erro é deixar a humanidade dos seus personagens em segundo plano para privilegiar efeitos especiais, ignorando a importância de uma história bem estruturada como condutora da imersão do espectador. Talvez seja a hora de Bryan Singer, idealizador da série, reavaliar o potencial narrativo do material que tem em mãos antes de lançar o próximo filme sobre os X-Men.
Ficha técnica
Ano: 2016
Duração: 144 min
Nacionalidade: EUA
Gênero: ação, aventura, fantasia
Elenco: James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Nicholas Hout, Sophie Turner, Oscar Isaac
Diretor: Bryan Singer
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