Por Marina Lordelo

 

Poucos cineastas retratam a tristeza e a solidão feminina com tamanha habilidade como Chantal Akerman. Claro que a sua delicada história de vida não pode ser negada para analisar a sua proposta autoral cinematográfica, uma trajetória marcada pela herança familiar do holocausto e por uma depressão profunda, que a levou a se suicidar em 2015. Em “Os Encontros de Anna” [Les Rendez Vous d’Anna] de 1978, sempre com uma dose autobiográfica, Akerman conta história da cineasta Anna (Aurore Clément), que precisa viajar diariamente para promover seu último filme.

Com planos fixos, longos, lentos, quase fotográficos, capazes de parar o tempo ou de dilatá-lo, Akerman geralmente coloca sua protagonista no centro da tela em uma simetria incômoda. O preciosismo da altura da câmera também reflete uma escolha estética: posicionada sempre na altura do olhar de Akerman, a diretora opta por manter uma posição “neutra” e refuta o uso dos famosos plongée e contra-plongée (de cima para baixou ou o contrário, respectivamente). Por vezes, desenquadra personagens mais altos, por conta do rigoroso posicionamento de câmera.

 

 

Akerman explora o uso dos espaços e o movimento dos corpos na mise-en-scène de forma a valorizar os planos fixos e a introspecção narrativa da protagonista. Ela consegue filmar cenas de sexo sem sexualizar o corpo e ao mesmo tempo garantir a autonomia da mulher, assim como é habilidosa em traduzir em um diálogo a sensualidade do discurso de Anna ao revelar uma de suas experiências íntimas para sua mãe.

Aliás, a mãe de Anna assume um papel relevante na narrativa, aparecendo hora em recados de hotel, hora através de uma amiga em comum. E a presença da sua ausência fica evidente quando o encontro entre mãe e filha finalmente acontece, revelando ao espectador o paradoxo de intimidade e distanciamento que há entre ambas.

E essa suposta liberdade e autonomia que Anna parece ter é retratada com profunda sensibilidade para apresentar a depressão da protagonista, sempre sozinha e a escutar os outros, sem empatia, sem alegria e numa procura incansável por algo que lhe afeta e se traduz em extrema solidão e apatia. Se assim era a mente de Akerman, ela vivia em intenso desconforto com o (sobre)viver.

 

Pôster:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ficha Técnica:

 

Ano: 1978

Duração: 120 min

Gênero: Drama

Diretor: Chantal Akerman

Elenco: Aurore Clément, Helmut Griem, Magali Noel

 

Trailer:

 

https://youtu.be/t5LEZND5rkk

 

 

Imagens:

Veja Também:

Kramer vs. Kramer

Por Luciana Ramos   [Contém Spoilers]   Ted (Dustin Hoffman) está tão distraído contando anedotas ao seu chefe que não...

LEIA MAIS

“Nasce Uma Estrela”: as histórias por trás da história que Hollywood adora contar

Hollywood é uma fábrica de derivações. Quando filmes engajam o público, os produtores correm para criar sequências com os personagens...

LEIA MAIS

Drácula

Por Bruno Tavares   O imaginário popular é repleto de ícones assustadores: monstros, seres que comandam forças desconhecidas, castelos com...

LEIA MAIS