Por Marina Lordelo

 

A realizadora belga Agnès Varda tem uma carreira consolidada no cinema europeu e mundial, especialmente no gênero documental. Em 1962 lança seu primeiro longa-metragem ficcional, “Cléo das 5 às 7 “,e em 1965 escreve e dirige “As Duas Faces da Felicidade” (Le bonheur), estrelado por Jean-Claude Drouot no papel do protagonista François Chevalier.

François é um camponês, casado e com dois filhos. Ele dispõe de uma família feliz e bem resolvida, até se apaixonar pela funcionária dos correios Émilie Savignard (Marie-France Boyer). Varda, que se apresenta em suas obras como uma ativista das causas feministas, enfrenta dessa vez um protagonista masculino em um contexto primaveril de traições.

Para acentuar o desconforto da temática a realizadora dispõe de um colorido estilo Van Gogh, com matizes de verde, amarelo e vermelho em contrastes que saltam a tela. A beleza imagética e o preciosismo dos planos gerais realçados pelas cores dialogam com a  felicidade de François, que se mantém em um relacionamento duplo onde ambas, sua esposa e sua amante, sabem que o seu coração está dividido.

 

 

Émilie e François assumem então uma regularidade de encontros, e em planos geometricamente fatiados, no que vem a ser uma das cenas de sexo mais potentes do cinema, seus corpos se encontram, se fundem e realizam o desejo de pertencerem um ao outro. Não a toa a montagem de Janine Verneau (também montadora em “Cléo das 5 às 7“) une a sequência de planos-detalhe com tamanha sensibilidade de forma a garantir o ritmo e a sensualidade necessários a cena pensada por Varda.

A velocidade precisa da montagem transforma o que seriam planos fotográficos em um cinema de minúcias, onde o menor movimento dos personagens arrebata o espectador pela força dos seus gestos – o piscar de olhos, o sorriso contido, a respiração ou o leve movimentar dos dedos. Os enquadramentos não convencionais de partes desnudas, onde o seio feminino, talvez o elemento mais erótico do corpo da mulher, é disposto com o mesmo impacto que o seio masculino desigualmente erotizado pelo cinema, simbologias políticas eficientes que a cineasta consegue reverberar na tela.

Mas é no fim trágico que Varda define a premissa de sua narrativa: ao passo que escolhe recalcar a maior parte dos sentimentos da esposa, assim como fez François, a realizadora enclausura Émilie na então vida de Thérèse e, assim, frente ao visual primaveril campestre saboreia a surrealidade (literal) da felicidade.

 

Pôster

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ficha Técnica

 

Ano: 1965

Duração: 79 min

Gênero: drama, romance

Direção: Agnès Varda

Elenco: Jean-Claude Drouot, Marie-France Boyer, Claire Drouot

 

Trailer: 

 

 

 

Imagens:

Veja Também:

As "comédias e provérbios" de Eric Rohmer

Por Felipe Galeno Dentre os aniversários de nomes famosos comemorados pelos fãs de cinema em 2020, um dos mais especiais...

LEIA MAIS

A Lista de Schindler

Por Melissa Vassali Há vinte e cinco anos foi lançado “A Lista de Schindler”, filme dirigido por Steven Spielberg que...

LEIA MAIS

Bastardos Inglórios

Por Melissa Vassalli Histórias de vingança com cenas de violência extrema, misturadas a diálogos cômicos, referências à cultura pop e...

LEIA MAIS