Por Melissa Vassalli
Histórias de vingança com cenas de violência extrema, misturadas a diálogos cômicos, referências à cultura pop e ao cinema de gênero, atuações expressivas e mise-en-scène criativa. Quem já assistiu a algum filme de Quentin Tarantino, sabe que é dele que estamos falando.
Tarantino começou sua carreira como diretor em 1992, com “Cães de Aluguel”, mas antes disso já havia escrito os roteiros que dariam origem a “Amor à Queima-Roupa” (dirigido por Tony Scott em 1993) e “Assassinos por Natureza” (dirigido por Oliver Stone em 1994). Todos os elementos que o tornariam conhecido já estavam presentes em suas primeiras obras, e, com o passar do tempo, se consolidaram na construção de um estilo único e inconfundível.
“Bastardos Inglórios” é a consagração desse estilo. Lançado em 2009, foi um projeto que tomou mais de dez anos de sua vida. Tarantino chegou a pensar em produzi-lo como uma série de televisão, mas mudou de ideia, graças a uma conversa em que Luc Besson lhe disse que ele era um dos poucos diretores que ainda o faziam ter vontade de ir ao cinema.
Como é habitual na sua filmografia, o longa apresenta histórias paralelas divididas em capítulos. De um lado, acompanhamos Shoshanna (Mélanie Laurent), uma judia que viu toda a sua família ser exterminada pelos soldados alemães, no início da ocupação nazista na França. Mais tarde, como proprietária de uma sala de cinema em Paris, a jovem é obrigada a exibir filmes de propaganda numa sessão que contará com a presença do próprio Adolf Hitler. Em paralelo, vemos a trajetória dos Bastardos Inglórios, um grupo de elite do exército americano composto por oito soldados judeus especializados em operações em território inimigo, cuja missão era assassinar o ditador alemão, sob o comando do tenente Aldo Raine (Brad Pitt).
O gênero predominante no filme é o de guerra, mas um filme de guerra de Tarantino possuí também muito humor negro e ironia, diálogos engraçados e situações absurdas. Isso faz de “Bastardos Inglórios” inovador em relação à abordagem da Segunda Guerra Mundial, tema amplamente trabalhado no cinema. Porém, o leva também para um ponto polêmico, pois ao se apropriar de um acontecimento histórico e criar narrativas de ficção tão peculiares para explorar seu próprio estilo e cinefilia – as citações no longa vão desde passagens clássicas da história do cinema, como uma referência a “Rastros de Ódio” na cena de abertura, a filmes de guerra menos conhecidos, como “Os Que Sabem Morrer” – o diretor faz uma sátira de um período delicado, algo que pouquíssimos realizadores ousariam fazer. Esse é um limite perigoso, mas podemos dar uma concessão ao realizador: motivados por seus planos de vingança, os personagens realizam o que provavelmente é um desejo comum entre espectadores de filmes sobre esse período: ir à forra contra os nazistas.
Unindo as duas pontas do filme, está o coronel Hans Landa (Christoph Waltz), responsável pela operação em que a família de Shoshanna foi assassinada, e que posteriormente também se confrontaria com os Bastardos Inglórios. O antagonista reúne as piores características que uma pessoa poderia ter, mas o cinismo e a presença de cena de Waltz prendem nossa atenção – tanto que o personagem rendeu um Oscar de melhor ator coadjuvante para ele. O próprio diretor considera Landa um dos melhores papeis que ele já escreveu, assim como parece ter se convencido de que este filme era, até então, sua obra-prima. Quando finalmente consegue talhar na testa de Landa uma suástica, é exatamente este o termo que Aldo Raine usa para falar sobre o seu trabalho, encarando o público em um enquadramento contra-plongée, plano frequentemente usado pelo cineasta.
Tarantino pode tanto ter sido sincero com suas impressões sobre o longa, como pode ter sido irônico consigo mesmo. Mas, de qualquer forma, com um enredo bem estruturado e dinâmico, muita metalinguagem e um jogo narrativo pós-moderno, que atualiza temas e estéticas do cinema, “Bastardos Inglórios” é um filme representativo em sua carreira, que sintetiza todas as suas marcas de estilo.
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2009
Duração: 152 min
Gênero: Guerra, suspense, ação
Diretor: Quentin Tarantino
Elenco: Christoph Waltz, Mélanie Laurent, Brad Pitt, Diane Kruger, Eli Roth
Trailer:
Imagens: