Por Bruno Tavares

 

Em geral, as pessoas são muito mais do que deixam transparecer para o mundo. Becky Albertalli, autora do livro “Simon vs. a Agenda Homo Sapiens”, soube definir bem: “as pessoas são mesmo como casas de quartos grandes e janelas pequenas”. Elas mostram para os outros uma pequena versão do universo interior que possuem. Dessa forma, não é de espantar que, ao revelarem um pouco mais sobre si, causem espanto e sejam consideradas “fora do normal”.

“Com Amor, Simon”, filme adaptado da obra de Becky, aborda de maneira peculiar essa faceta da sociedade. Nele, Simon Spier (Nick Robinson) é um adolescente gay que se vê às voltas com a decisão de contar esse fato à sua família e amigos. Não que ele tenha alguma dúvida quanto à sua sexualidade. Na verdade, Spier teme que, ao saberem, as pessoas que ele mais ama passem a trata-lo diferente. Essas seriam seus amigos Nick Eisner (Jorge Lendeborg Jr.), Leah Burke (Katherine Langford) e Abby Susso (Alexandra Shipp), além de seus pais, Emily (Jennifer Garner) e Jack (Josh Duhamel). Para completar a carga emocional, o jovem se apaixona por Blue, um correspondente misterioso com quem conversa apenas por e-mails. Por conta disso, ele passa os dias a se perguntar quem seria o enigmático garoto e o procura nas aulas, na turma de teatro ou mesmo em restaurantes.

 

 

Em um ano repleto de produções coming of age, o filme em questão é, sem dúvidas, o mais leve de todos. Enquanto em “Lady Bird” acompanhamos a conflituosa relação da personagem com sua mãe e em “Me Chame pelo seu Nome um romance de verão, “Com Amor, Simon” nos mostra as descobertas do primeiro amor e as dificuldades em sair do armário. Tal leveza se dá graças ao material sólido no qual o título se baseia. O livro de Albertalli reproduz bem os diversos sentimentos adolescentes e esses são fielmente traduzidos em tela.

Sempre com um tom de humor, o longa apresenta as situações constrangedoras e o entusiasmo amoroso típicos da idade. Aqui vale destacar algumas cenas características: a primeira é o conjunto de vezes que o protagonista imagina Blue. À medida em que a narrativa avança, o amante secreto toma a forma do garoto que mais chama a atenção de Simon naquele momento, uma atitude comum entre os jovens. A segunda é o auge do filme, onde Simon dá voltas em uma montanha-russa. Apesar de conter a conhecida metáfora sobre os altos e baixos da vida, a situação é conduzida de maneira delicada e comovente.  Esses ápices emocionais são embalados por uma trilha sonora afinada que contribui muito para a ambientação dos personagens.

Outros detalhes distribuídos nomis-em-scène também auxiliam na construção de suas personalidades. No quarto de Simon, por exemplo, sempre é possível ver pacotes de Oreos, bonecos do desenho Hora da Aventura e pôsteres do cantor Eliott Smith. Tais elementos imergem o espectador na vida do garoto e mostram que tudo ali tem um sentido, especialmente para quem leu os livros. Um último detalhe transportado das páginas para as telas são as frases de efeito. Além de mostrarem uma profundidade de sentimentos, é certo que tais citações em breve serão copiadas à exaustão em legendas de fotos.

 

 

Sob a batuta de Greg Berlanti, o longa conta ainda com casting assertivo. Nick Robinson está bem como protagonista e consegue demonstrar com credibilidade os embates e as dúvidas que Simon enfrenta. Quem também chama atenção é Katherine Langford e Miles Heizer que, por sua experiência prévia em “13 Reasons Why”, entregam atuações seguras e bem delineadas. Ao contrário, Alexandra Shipp e Jorge Lendeborg Jr. patinam um pouco na pele de seus personagens. Para compensar, as melhores risadas ficam a cargo do excelente Tony Hale, que vive o diretor Worth, e de Natasha Rothwell, a hilária professora de teatro.

Mesmo com tantos acertos, o grande mérito da produção reside na inclusão proporcionada por seu roteiro. Filmes com paixões adolescentes são comuns, mas poucos verdadeiramente se adequam bem à sociedade plural em que vivemos. “Com amor, Simon” gera identificação com espectadores de diversas idades, gêneros e opções sexuais. Isso por apresentar situações que são essencialmente humanas: a busca por um amor verdadeiro, o primeiro relacionamento, a toxicidade das mídias sociais. Mesmo que cubra tudo com uma camada de açúcar e recaia no clichê final feliz, o título tem um discurso de tolerância e aceitação que se destaca. Longe de ser perfeito, o longa ganha créditos por manter a diversidade em pauta e incentiva que as pessoas mostrem quem realmente são.  Para uma realidade tão preconceituosa, isso já é muito.

 

Pôster

 

Ficha Técnica:

Ano: 2018

Duração: 110 min

Gênero: Comédia, Drama, Romance

Diretor: Greg Berlanti

Elenco: Nick Robinson, Katherine Langford, Jorge Lendeborg Jr., Alexandra Shipp, Jennifer Garner, Josh Duhamel.

 

Trailer:

 

Imagens:

Avaliação do Filme

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