Por Luciana Ramos

 

Brian Henson cresceu cercado de bichos de pelúcia. Seus pais, Jim e Jane Henson, foram exímios marionetistas que  popularizaram a profissão através da criação de dois programas icônicos da televisão americana: “Vila Sésamo” e “Os Muppets”, ambos transmitidos posteriormente no Brasil. Brian assumiu o controle das empresas desenvolvidas ao longo de frutíferas décadas, tendo participado ativamente na produção de filmes voltados para crianças, como “Os Muppets e o Mágico de Oz” e “João e o Pé de Feijão”.

A imersão nesse mundo colorido e inocente pode ter sido o fator determinante do desejo de desconstruir esses personagens, envolvendo-os em uma atmosfera adulta e, consequentemente, mais sórdida. Por isso, levou quase dez anos desenvolvendo “Crimes em Happytime”, algo inexplicável quando se assiste aos seus primeiros dez minutos. Concebido como uma obra provocativa por trabalhar com a quebra de expectativas de um público acostumando a esses animais sendo fofos, o longa não consegue ir além das piadas rasas de conotação sexual que somente servem para alardear o quão dispensável é toda a produção.

A trama é centrada em torno de Phillip (voz de Bill Barretta), um ser de pelúcia que já foi policial, mas agora vive resolvendo pequenos casos como detetive particular. A visita de uma ruiva sensual que diz estar sendo ameaçada o leva a uma locadora/produtora pornográfica, onde ele (quase) testemunha uma execução. Desse evento, desdobra-se uma série de assassinatos de atores de uma sitcom de sucesso da década de 90 chamada “The Happytime Gang”.

 

 

Seu envolvimento com algumas dessas pessoas no passado e, acima de tudo, a inconveniência da sua ligação às cenas de assassinatos o levam a, relutantemente, buscar a ajuda da ex-parceira humana Connie Edwards (Melissa McCarthy). Juntos, eles mergulham no submundo de pelúcia para desvendarem o criminoso antes que seja tarde demais.

Ao começo, o filme é envolto por uma aura noir, expressiva tanto na narração em off como na ambientação decadente e introdução de figuras como a femme fatale. Este tratamento é logo suprimido, substituído pela evolução narrativa aos moldes de filmes policiais, trabalhando os “opostos cômicos” (em aspas por serem dolorosamente sem graça) como fórmula de piadas.

O humor resume-se a um universo pouco inspirado ou aprofundado, referindo-se à masculinidade da personagem de Melissa McCarthy, confundida diversas vezes por um homem, ou no apetite sexual dos seres de pelúcia, dando vazão a cenas envolvendo ejaculações sem fim, produções sadomasoquistas de filmes pornôs baratos e até uma cruzada de perna à la “Instinto Selvagem” com uma penugem avermelhada. Quando foge da sexualidade, o roteiro aposta nas drogas açucaradas, que serve como uma oportunidade de deixar os personagens largados na sarjeta, imundos e, assim, menos encantadores.

 

 

A reiteração do emprego desse tipo de piada explicita a vontade do diretor em redirecionar elementos infantis a um mundo estritamente adulto, uma forma de se tornar atraente aos que cresceram assistindo conteúdos do tipo e que agora estão maduros o suficiente para encarar a desconstrução desse universo em formato cômico. É igualmente evidente, porém, a falta de originalidade, sagacidade ou sequer inteligência na construção de uma história minimamente coerente, quiçá engraçada.

A tentativa de maior aprofundamento com o emprego da divisão social entre humanos e bichos de pelúcia – e, assim, a discussão do preconceito – é logo abandonada, já que, aparentemente, a inclusão de cenas como a que McCarthy morde os órgãos sexuais macios de Phillip é, aparentemente, mais apelativo. Ao final, faz-se uma nova tentativa de alavancar a história com o uso de plot twist, um recurso tão genericamente empregado em Hollywood que se tornou clichê por ser facilmente farejado.

Sem nenhum momento marcante, “Crimes em Happytime” cansa pela sua obsessão em ser provocativo – em especial, por não mostrar nada de novo em termos narrativos ou de cumprir a expectativa básica do seu gênero, o de ser minimamente engraçado. As piadas sexuais esgotam-se nos primeiros cinco minutos e o filme demonstra não ter nada além para oferecer, tornando-se uma experiência dolorosa.

 

Pôster

 

 

Ficha Técnica

 

Ano: 2018

Duração: 91 min

Gênero: ação, comédia, crime

Direção: Brian Henson

Elenco: Melissa McCarthy, Elizabeth Banks, Maya Rudolph, Leslie David Baker, Joel McHale

 

Trailer:

 

 

Imagens:

Avaliação do Filme

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