Por Luciana Ramos
O road movie é um gênero tipicamente americano que consiste em uma viagem que serve como um gatilho para uma jornada espiritual de autoconhecimento e amadurecimento. Os encontros pelo caminho metaforizam-se no embate interior que se sucede e questões soterradas no fundo da mente ganham soluções práticas.
Essa é a construção narrativa adotada em “Entre Idas e Vindas”, novo longa de José Eduardo Belmonte. Desvencilhando-se de um cinema mais autoral, o diretor flerta com os filmes mais acessíveis ao mercado sem deixar de lado a preocupação de conceder profundidade à obra.
A história é centrada nas amigas que trabalham juntas como atendentes de telemarketing Amanda (Ingrid Guimarães), Cillie (Caroline Abras) e Krisse (Rosanne Mulholland), que partem rumo ao litoral para comemorar a despedida de solteira de Sandra (Alice Braga). Incertezas acumulam-se pelo caminho, em especial ao que concerne o futuro da noiva, e um encontro fortuito com Afonso (Fábio Assunção) e Benedito (João Assunção, filho do ator em sua estreia no cinema) põe a vida das quatro mulheres em perspectiva. Somadas as suas questões estão os dilemas de pai e filho, que seguem viagem em busca do reencontro com a mãe do garoto, há muito distante.
Diante de uma estrutura bem construída de acontecimentos, Belmonte e Cláudia Jouvin, responsáveis pelo roteiro, engrandecem o tema a partir da humanização de seus personagens. Na trama, as vivências compartilhadas de cada um apontam alguma questão no outro, que questiona sua forma de lidar com o assunto e descobre mais sobre si. Em decorrência, há um processo de amadurecimento coletivo que não ocorre com a mesma velocidade, um aspecto positivo do arco dramático.
É certo que o filme não entrega mais do que promete e, transitando na previsibilidade, pontua passagens dramáticas com o humor, fruto especialmente dos diálogos da personagem Cillie, alívio cômico da trama. A falta de uma abordagem nova ou surpreendente é facilmente suprimida pelo tom leve e agradável da experiência.
Tal processo só consegue se concretizar através do bom delineamento de todos os personagens, mesmo com as diferenças de espaço de tela entre os papeis de Ingrid, Fábio e Alice com os de Rosanne e Caroline. A sutileza no tratamento da história é igualmente importante e revela-se em passagens aparentemente simples, porém tocantes, como a aposta em torno da história mais triste em uma festa.
Igualmente feliz é a escolha dos lugares por onde o motorhome transita. Os comuns retratos estereotipados dão lugar a paisagens belas e simples, pontuada por uma fotografia muito bonita, que sabe explorar as potencialidades de cada ambiente. O elenco é outro destaque pelo entrosamento dos atores. Os trejeitos e pequenas nuances de cada um somam-se de maneira harmoniosa e todos conseguem entregar a dramaticidade requerida dos personagens.
Sem maiores complexidades ou grandes surpresas, “Entre Idas e Vindas” consegue firmar um elo emocional com o espectador ao entregar-lhe o prometido: um filme leve, extremamente agradável e tocante. Transitando entre o cinema comercial e o autoral, representa um bom avanço na carreira de Belmonte, assim como no cinema nacional como um todo, tão carente de investidas do tipo.
Ficha técnica
Ano: 2016
Duração: 100 min
Nacionalidade: Brasil
Gênero: comédia, drama, romance
Elenco: Ingrid Guimarães, Alice Braga, Caroline Abras, Rosane Mulholland, Fábio Assunção, João Assunção
Diretor: José Eduardo Belmonte
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