Por Luciana Ramos
Em 1968, pessoas tomaram as ruas para demonstrar sua insatisfação com o molde político e social vigentes; jovens protestavam contra a Guerra do Vietnã; hippies firmavam-se como o antídoto aos baby boomers, criados em uma atmosfera consumista na década anterior. O mundo inteiro passava por uma convulsão que iria mudar a percepção social do que era relevante para a sociedade.
Dentre os assuntos debatidos, estava o feminismo e consequente luta por mudanças sociais que eliminassem a desigualdade entre gêneros. No entanto, em 1971, Nora (Marie Leuenberger) continuava a viver de forma regrada e submissa em uma pequena aldeia da Suíça. Ela divide seus dias em criar os dois filhos e visitar as casas de sua família inteira para lavar, passar, arrumar e cozinhar para todos. Resignada, ignora pequenos pontos de mudança, como o comportamento da sobrinha, Hannah (Ella Humpf), e reitera discursos machistas a quem lhe pedir uma reflexão sobre o papel da mulher.
Porém, acontecimentos familiares frustrantes somam-se à vontade de trabalhar para poder ter uma renda própria – e um objetivo mais claro de vida. A negação do seu marido que, por lei, deveria autorizá-la a realizar o ofício, leva Nora a um nível de frustração que a faz abraçar a causa do direito das mulheres ao voto – em voga na região. Junta-se a ela a idosa e bem-humorada Vroni (Sybille Brunner) e a italiana recém-chegada Graziella (Marta Zoffoli). Juntas, elas procuram engajar as outras mulheres a exigirem maior protagonismo nas suas vidas – incluindo desafiar a vontade dos maridos, que borbulham de raiva com a novidade.
O roteiro apresenta seu tema com sutileza e sagacidade, a pequenos passos: um corte de cabelo, uma negativa em fazer o jantar. As atitudes chocam e demandam adaptações dos homens ao redor, que demonstram entender o recado com gestos cômicos de aceitação. Nessa disputa por pequenos exercícios de poder, a história se desenvolve de forma leve, sagaz e bastante divertida. São inúmeras as cenas que provocam risos, muito por conta da ótima direção de elenco, que demonstra sintonia. O destaque fica por conta de Marie Leuenberger que, enquanto protagonista, consegue carregar a trama, mesclando a fragilidade de alguém que nunca tomou decisões antes com a assertividade necessária nos momentos importantes. Ela brilha com o olhar e demonstra ter excelente timing cômico.
A trama desenvolve-se de maneira satisfatória até o final do segundo ato, quando se rende ao molde dramático clássico, apresentando uma reviravolta desnecessária. Esta culmina em uma cena que tem por claro objetivo o de emocionar através de um discurso apaixonado, mas acaba provocando outro indesejável efeito: ela reduz o tema, atrelando todo o trabalho de conscientização feito até o momento a palavras proferidas em uma ocasião solene, uma injustiça ainda mais sentida dada a relevância do tema.
A finalização romantizada (ainda que pertinente a história) consolida “Mulheres Divinas” como um feel good movie sobre um assunto extremamente pertinente. Mais de quarenta anos depois do tempo retratado ficcionalmente, a desigualdade entre gêneros ainda é claramente perceptível e acabar com ela demanda engajamento e luta ao redor do mundo. Assim, um filme sobre o tema que alia inteligência e divertimento torna-se essencial para qualquer mulher.
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2017
Duração: 96 min
Gênero: drama, comédia
Diretor: Petra Volpe
Elenco: Marie Leuenberger, Maximillian Simonischek, Sybille Brunner, Marta Zoffoli
Trailer:
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