Por Luciana Ramos

 

Avalonia é uma pequena e primitiva cidade cercada por montanhas, que alimenta o sonho de seus habitantes em um mundo mais evoluído além das barreiras geográficas. Movido por essa paixão (e um claro desejo por reconhecimento), Jaeger Clade (voz de Dennis Quaid) comanda uma aventura exploratória e, em determinado ponto, deixa o filho adolescente Searcher (voz de Jake Gyllenhaal) para trás. Pouco afeito ao tipo de masculinidade propagada pelo pai, o garoto é cerebral e se vê atraído pela luminosidade de Pando, um grão energizado que acaba revolucionando sua cidade natal.

Vinte e cinco anos mais tarde, este curioso alimento é o principal condutor de energia da comunidade, e Searcher o seu grande produtor. O surgimento de pequenos apagões preocupa Callisto (voz de Lucy Liu), chefe local que convoca o fazendeiro a uma expedição. Ele não só vai a contragosto, como descobre que sua família também deu um jeitinho de participar da aventura. A bordo de uma nave, o grupo se depara acidentalmente com um riquíssimo submundo.

Os animais de inspiração aquática passeiam em grupos ordenados, por vezes atacando algo que enxergam como ameaça. Lagos ácidos irrigam os solos, nuvens rosadas e fofinhas preenchem espaços. Quando devastados, os caminhos são refeitos pelo trabalho ordenado de seres que lembram anêmonas. O local parece inóspito aos humanos e acaba forçando reflexões no grupo: quando desconhecem a dinâmica que os cerca, eles respondem com impulsividade, movidos pela busca de sobrevivência; pouco a pouco, desenvolvem a capacidade de observação e aprendem sobre os mecanismos que ditam a harmonia do lugar, podendo então apreciar a sua beleza.

Desde o início, “Mundo Estranho” se configura como uma grande alegoria climática, estabelecendo causalidades que impulsionam a trama. Esta segue o estilo jornada ao centro da Terra, propondo uma conexão emocional baseada nas descobertas dos personagens. Repetições temáticas e argumentativas resultam em um indesejado tom didático que, por vezes, prevalece e, na ausência de novas ideias, o filme parece morno à primeira vista. Porém, a noção de sacrifício individual em prol de uma ética coletiva – ou, melhor dizendo, de engajamento social pela viabilidade de futuro – apresentada ao final deixa um gostinho reflexivo que permanece após os créditos.

Também interessante é o debate sobre masculinidade, abordado através de uma perspectiva geracional. Por semelhança e contraste entre os comportamentos de Jaeger, Searcher e Ethan (voz de Jaboukie Young-White), são traçadas discussões relevantes sobre família e legado. Do avô machista e destruidor ao neto sensível e perceptivo, o filme questiona quais atitudes são meras reproduções do passado e, assim, como podemos quebrar ciclos destrutivos sem perder de vista a influência de gerações passadas na nossa construção de mundo. Igualmente positiva é inclusão de um personagem abertamente gay na narrativa, tratado com a naturalidade e respeito requeridos, delineado de maneira positiva e relevante, certamente um avanço na representação da comunidade LGBTQIA+ no campo das animações.

“Mundo Estranho” pode não possuir o brilho ou inventividade de outras produções da Disney, mas conquista relevância ao mesclar importantes temas contemporâneos em um invólucro leve, instigante e divertido.

Ficha Técnica

Ano: 2022

Duração: 1h 42 min

Gênero: aventura, ação, comédia, fantasia

Direção: Don Hall, Qui Nguyen

Elenco: Jake Gyllenhaal, Jaboukie Young-White, Gabrielle Union, Dennis Quaid, Lucy Liu, Alan Tudyk

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