Por Luciana Ramos

 

O roteiro de “Um Lugar Silencioso”, escrito por Bryan Woods, Scott Beck e John Krasinski, trabalha com as premissas do suspense para criar um clima de tensão, que envolve o espectador à medida que este testemunha a luta de uma família para sobreviver. Neste intuito, devem seguir uma série de regras específicas, sendo a mais importante nunca fazer barulho.

Neste mundo pós-apocalíptico, a raça humana foi quase completamente exterminada por criaturas que são atraídas pelos sons, matando sem piedade tudo que seus apurados radares conseguem identificar. Conforme notificado pelos recursos visuais, como páginas de jornais velhas, a humanidade aos poucos foi descobrindo essa ligação, o que possibilitou aos que souberam adaptar-se a chance de continuar vivendo.

 

Em uma multiplicidade de enquadramentos, conectados por uma eficiente direção, é apresentada a jornada da família em questão, liderada por um casal que se divide nas tarefas rotineiras e, primordialmente, na proteção dos filhos. Andando sempre descalços, são cautelosos com tudo que tocam, contemplando o silêncio quase absoluto como essencial. Entre si, comunicam-se utilizando a linguagem dos sinais, organicamente incorporado pela deficiência natural da filha.

Ainda que de início explore mais as figuras provedoras dos pais, a trama logo indica o papel vital que a personagem adolescente tem na história, uma vez que a sua condição prejudica a percepção do perigo, o que a faz necessitar de maiores cuidados. Daí, surgem seus conflitos recorrentes com o pai, de quem deseja um certo afastamento independente. Porém, é a disposição deste em aprimorar sua percepção auditiva que a leva a um entendimento mais aprofundado das criaturas, um caminho necessário para a construção de um clímax eficiente.

Atendo-se a simplicidade, a narrativa explora bem cada elemento inserido e esse caráter minucioso transmuta-se em uma ligação emocional intensa, baseada em um misto de medo, preocupação e curiosidade. Tal como antecessores no gênero, como “Tubarão”, o longa comprova que criar um clima envolvente, mantendo o foco primordial nos desafios da experiência humana, é mais importante que explorar as características monstruosas da ameaça.

Esse conceito é potencializado nas mãos de John Krasinski, que realiza sua terceira incursão na direção. Trabalhando com uma multiplicidade de planos, ele explora bem o talento do seu conciso elenco, que transmite fisicamente os sentimentos de seus personagens. As atuações pautadas em fortes expressões faciais, que guiam o público, são aos poucos substituídas por trabalhos corporais mais expressivos, acompanhando a graduação dramática.

A competência técnica é, sem sombra de dúvidas, o que destaca esta obra de outras produções do gênero. A imersão imagética é enaltecida pela fotografia de Charlotte Bruus Christensen, que realiza um jogo de luz e sombras, e, em especial, pelo primoroso design de som. Afim de compensar os diálogos esparsos, a trilha sonora realiza um papel essencial na lembrança constante do perigo, complementado pela mixagem de som, que potencializa o impacto de cada pequeno efeito sonoro ao nível máximo.

Assim, “Um Lugar Silencioso” demonstra que a qualidade de uma obra está menos conectada a megalomanias imagéticas do que a confecção cuidadosa de cada elemento narrativo e técnico. Atendo-se a uma trama simples, cumpre a sua promessa fílmica de prover emoção ao espectador, que desafia a calamitosa realidade pintada ao torcer por um final satisfatório. Cabe dizer que este, por sua vez, termina no ponto certo, sem alongar demais a experiência vivida, deixando o espaço necessário para ponderações após o término da projeção.

 

Pôster

 

 

Ficha Técnica

Ano: 2018

Duração: 90 min

Gênero: suspense

Direção: John Krasinski

Elenco: John Krasinski, Emily Blunt, Noah Jupe, Millicent Simmonds

 

 

Trailer:

 

 

 

Imagens:

Avaliação do Filme

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