Por Murillo Trevisan
“Sexta-feira, dia 22 de Julho de 2011. A Noruega é atingida por dois ataques terroristas. o primeiro deles, um carro-bomba que explode na área governamental de Oslo. Em seguida, um massacre na Ilha de Utoya, no acampamento da juventude do Partido Trabalhista Social-Democrata. O Executor foi um homem de 32 anos, militante da extrema-direita chamado Anders Behring Breivik.”. As palavras que precedem a narrativa nos contextualizam e preparam para apresentar mais um ato de intolerância contra uma sociedade multicultural.
Após pequenos cortes de cenas reais do primeiro ataque em Oslo, somos transpostos para a Ilha de Utoya, dentro do acampamento de jovens da Arbeiderpartiet (Partido Trabalhista) onde, aos moldes da série “24 Horas”, acompanhamos em tempo real os 72 minutos do segundo ataque. Simulando uma quebra de 4ª parede, Kaja (Andrea Berntzen) olha para a câmera e declama: “Vocês nunca vão entender. Só escute o que eu digo… Certo?”. Em seguida, vira de lado e revela-se que está falando no celular com sua mãe, se referindo ao motivo pelo qual estão acampando. Suas palavras são praticamente um aviso que, mesmo com total imersão ao filme, ainda assim será impossível se colocar no lugar das vítimas.
A partir daí, seguimos (literalmente) Kaja pelo acampamento, tendo reconhecimento espacial do local e sendo apresentados, mesmo que superficialmente, à seus colegas de camping. Seu caráter protetor é notado pelo modo como age com sua irmã mais nova Emilie (Elli Rhiannon Müller Osbourne), que não demonstra a mesma consideração aos propósitos da manifestação, usufruindo do acampamento apenas como diversão.
Quando os ataques se iniciam, essa característica humanitária da protagonista vem mais à tona e é muito benéfica ao roteiro, trazendo uma diversidade de caminhos dos quais ela guiará, desde ajudar um garoto perdido em meio ao tiroteio até sua jornada principal na trama, que é de achar a irmã que se perdeu durante a confusão.
Diferentemente do longa de Paul Greengrass feito em parceria com a Netflix, aqui o diretor Erik Poppe (“Mil Vezes Boa Noite”) opta por apresentar apenas o momento do ataque na perspectiva das vítimas, sem “perder tempo” em narrar o pós-fato, deixando o ritmo bem mais frenético, compacto e interessante. Essa façanha deve-se muito à escolha da fotografia comandada por Martin Otterbeck (“Per Fugelli: Siste resept”), que se arrisca-se na perigosa e trabalhosa técnica de plano-sequência, fazendo uma completa projeção sem cortes e com câmera na mão, o que contribui ainda mais para uma profunda imersão do espectador. Propositalmente ou não, a opção de narrativa acaba por rememorar o Massacre de Columbine, retratado no filme “Elefante (2003)” de Gus Van Sant, que ficou bastante conhecido por uma cena em estilo semelhante.
Mesmo com o infeliz final já conhecido, o filme conquista uma comoção ainda maior com um pequeno plot twist, confirmando que os mínimos detalhes são de grande importância. Mais do que um excelente filme, “Utøya 22 de Julho” nos serve como um sinal de alerta para o constante crescimento do extremismo de direita na Europa e no mundo, tornando como “inimigo” todo aquele que é ou pensa diferente. E cada vez mais pessoa compartilham dessa posição.
*Esta crítica faz parte da cobertura da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2018
Duração: 93 min
Gênero: drama, suspense
Direção: Erik Poppe
Elenco: Andrea Berntzen, Aleksander Holmen, Solveig Koløen Birkeland
Trailer:
Imagens: