Por Luciana Ramos
Quando criança, Natalie (Rebel Wilson) costumava sentar na frente da televisão para observar uma linda e alegre Julia Roberts se apaixonar pelo rico e carismático Richard Gere em “Uma Linda Mulher”. Sua mãe (Jennifer Saunders), no entanto, era enfática ao frisar que filmes como aquele eram extremamente distantes da vida real: nesta ninguém ia se encantar à primeira vista ou chegar com uma limusine para salvá-la.
Ressentida, a garota cresceu e adquiriu um ar cínico que a impede de observar o amor se manifestar ao seu redor. Ela não perde uma oportunidade sequer de destrinchar o seu desdém por produções do tipo com a amiga Whitney (Betty Gilpin), característica alinhada a sua personalidade pessimista. Um dia, após um ataque no metrô, ela acorda em uma nova cidade, que não cheira mais a urina, como diz, mas a flores. Tudo ganha cor, as pessoas estão mais felizes e delicadas, chegando ao cúmulo de dançar espontaneamente. Quando Blake (Liam Hemsworht), um potencial cliente que até então a ignorara se apaixona por ela, Natalie percebe estar presa no seu maior pesadelo: uma comédia romântica.
Inteligente e divertido, “Megarrromântico” se propõe a ressignificar o tão adorado subgênero sem quebrar o seu molde. Referenciando filmes icônicos a todo momento, como “Harry e Sally – Feitos Um Para o Outro”, “Jerry Maguire” e “O Casamento do Meu Melhor Amigo”, expõe criticamente a construção narrativa limitada destes longas, que, em geral, seguem uma fórmula pouco naturalista.
Natalie, por exemplo, subitamente ganha um apartamento maior (não condizente com sua renda) e passa a ser respeitada no seu ambiente de trabalho, mostrando a recusa do subgênero em tratar problemas reais, como o machismo, reforçado pela transformação de Whitney em sua “arqui-inimiga”. Igualmente incômoda é a sua certeira observação sobre o papel do “melhor amigo gay”, sempre disposto a fazer o possível para ajudar a protagonista. Esta caracterização cai em um indesejado estereótipo, já que anula traços de personalidade, motivações próprias ou, em alguns casos, qualquer indício de uma vida social dissociada da amiga a quem é leal.
A cada cena, é apresentado algum elemento típico das comédias românticas, por vezes criticado pela protagonista, por outras, ridicularizado. Porém, em determinado momento a protagonista se dá conta de que, para sair do seu pesadelo, ela deve abraçá-lo. Com isso, a moça se rende aos pensamentos em voz alta, que se transformam em narrações em off excessivamente explicativas, às elipses temporais que tornam sua vida Pg-13 (classificação indicativa de filmes leves), à inevitável sequência musical.
O desenrolar de sua jornada pessoal de aceitação através dos inúmeros clichês atesta a intenção dos roteiristas Erin Cardillo, Dana Fox e Katie Silberman em renovarem o subgênero a que devotam os seus olhares sem rejeitá-lo totalmente, adequando a sua fórmula a uma narrativa mais rica no tratamento de seus personagens e, por ser mais cético em relação à sua própria estrutura, também mais aprofundado. Cabe salientar a inteligência do roteiro em incluir todo este trabalho sem abrir mão do humor sagaz, que torna o longa tão leve e divertido quanto os filmes icônicos que reverencia.
Ao mesmo tempo engraçado e reflexivo, “Megarrromântico” é um deleite, comandado pelo talento cômico de Rebel Wilson que, em uma performance menos exagerada do que o usual, demonstra o seu potencial como atriz. Ao seu lado, está um elenco bastante afinado, composto por Liam Hemsworth, Adam Devine, Betty Gilpin e Priyanka Chopra, que transmite a credibilidade necessária para transportar o espectador ao universo mágico – e um pouco enjoativo – das comédias românticas.
Ficha Técnica
Ano: 2019
Duração: 89 min
Gênero: comédia romântica
Diretor: Todd Strauss-Schulson
Elenco: Rebel Wilson,Liam Hemsworth, Adam Devine, Betty Gilpin, Priyanka Chopra
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