Por Paulo Lannes
O filme “A Bruxa” (2015) é sempre uma boa pedida para os amantes do terror. Não se trata de um filme de sustos, muito menos de ataques trashs, mas sim de uma história em que o medo está calcado na ignorância, na crença fervorosa e na intolerância, elementos capazes de alimentar um monstro e destruir uma família inteira – ao menos, é o que a obra tenta provar.
A trama, dirigida por Robert Eggers, está centrada em uma família de colonos protestantes que vivem na Nova Inglaterra (EUA) de 1630 – período bem próximo de outras narrativas do mesmo tema, como “As Bruxas de Salém” (1996). Eles são isolados da aldeia em que viviam e entram em um assustador processo de autodestruição após o sumiço do bebê.
Daí percebe-se que o espectador sabe mais sobre a situação da trama do que os próprios personagens: vemos uma bruxa-monstro se alimentando da criança, enquanto seus parentes ficam até o fim sem saber qual foi o destino final. Daí em diante sucede-se uma série de situações que colocam cada um dos membros da família diante de seus demônios e acentuam o caráter da obra cinematográfica.
Como o filme já escancara o aspecto fantasioso da trama, a narrativa se centra em ilustrações de mitos folclóricos daquele período. O primogênito é levado à floresta após ser ludibriado por uma bela mulher e volta com um espírito dentro de si, obrigando-o a morrer após um “exorcismo” familiar. Os gêmeos, caçulas da família, são verdadeiras pestes que conversam com o “black Philip“, um bode que encarna o mal, e canta músicas em prol do diabo sem parar. A mãe, completamente sufocada pelo luto, tem ilusões com o seu bebê desaparecido e sofre diante de alucinações em que o bico de seu peito está sendo mordiscado por um corvo assustador. O pai (que tem características físicas muito parecidas com as de Jesus Cristo em sua representação mais famosa no Ocidente) se mantém distante do sentimento familiar e age severamente com seus filhos e com sua esposa, estando de acordo com seus preceitos religiosos.
Porém, a personagem principal de toda a história é Thomasin (Anya Taylor-Joy), a única que parece perceber os efeitos negativos da superstição familiar – tornando-se o alvo de desconfiança de todos os parentes. É aquela máxima: “se você é a única que discorda de nós, então você é a culpada por tudo”. Ela carrega nas costas a dor pela perda do bebê e do irmão, tenta lidar com as chantagens dos gêmeos, sofre com as acusações da mãe e aguenta firme a violência do pai.
O filme parece uma bela homenagem aos trabalhos do artista espanhol Goya. O pintor denunciou as trevas promovidas pela Inquisição e pelas guerras, retratando os mortos, e pintando seus maiores terrores: bruxas, animais da noite (como corvos) e bodes negros (idênticos ao black Philip). A última cena do filme é o quadro “Voo das Bruxas” em frames.
Thomasin decide sair após encontrar todos seus familiares mortos, tira toda sua roupa e marcha até a floresta. Lá encontra outras belas mulheres dançando em torno de uma fogueira, até que todas começam a levitar. Ela, que se vê diante da impossibilidade de vencer a ignorância e misticismo, entrega-se a ele, irrompendo uma poderosa e sarcástica risada.
Pôster
Ficha Técnica:
Ano: 2015
Duração: 93 min
Gênero: terror
Direção: Robert Eggers
Elenco: Anya Taylor-Joy, Ralph Ineson, Kate Dickie
Trailer:
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