Por Melissa Vassalli
Em “A Esposa”, Glenn Close interpreta Joan, uma mulher que abriu mão de sua carreira como escritora para se dedicar totalmente ao marido, o famoso romancista Joe Castleman (Jonathan Pryce). Mas quando seu companheiro é indicado ao Prêmio Nobel de Literatura, ela passa a questionar as escolhas que fez nos últimos 40 anos.
Este filme tem rendido bons frutos para Close, que nesta temporada já ganhou o Globo de Ouro, o prêmio do Sindicato dos Atores e dividiu com Lady Gaga o Critics Choice Award. Agora, ela é uma das favoritas ao Oscar.
E ela não só está bem no papel, como é um dos pilares do longa. Isso porque, além de toda a narrativa ser centrada em sua personagem e na dinâmica de seu casamento, Joan é uma mulher contida, acostumada com a subserviência, que fala pouco sobre seus próprios sentimentos. Assim, o filme depende da capacidade da atriz de expressar mesmo sem verbalizar, de ter uma postura complacente quando seu olhar transmite desconforto – ainda que ao final algumas cenas permitam reações mais exacerbadas.
São recorrentes os momentos em que ela aparece em destaque no quadro enquanto outros falam, sobretudo Joe, o que gera uma contradição, pois coloca em evidência a forma como ela é constantemente silenciada, mas deixa ver também o seu protagonismo.
Adaptado de um romance escrito pela autora Meg Walitzer e dirigido por Björn Runge, “A Esposa” desenvolve bem a questão da desigualdade entre gêneros e da cultura patriarcal em que os personagens vivem (o que é acentuado pelo fato de a história ser ambientada nos anos 1990, com flashbacks nos anos 1950).
Se fosse apenas um estudo sobre isso, o filme se bastaria. Há várias passagens interessantes que retratam o assunto. Joe é o típico marido folgado e abusivo. Elogia sua esposa em todos os discursos, mas faz isso apenas para criar uma imagem melhor de si mesmo – ou “não parecer narcisista”, nas palavras dele. Há uma cena que se repete em momentos distintos da vida dos personagens, e nota-se que ele substituiu o pronome “nós” por “eu” ao longo dos anos, deixando claro o apagamento de Joan. O filho deles também repete essa lógica opressora. Enquanto procura validação do pai, menospreza qualquer opinião vinda de sua mãe.
Mas há um problema central no roteiro. O casal guarda um segredo, o que poderia contribuir para o aprofundamento dos conflitos, porém a demora em confirmá-lo tira a surpresa da revelação, pois ele já fica explícito no instante em que é sugerido. A tentativa de criar mistério enfraquece a narrativa. O filme ganha nos momentos em que se preocupa mais com os efeitos desse segredo ao longo dos anos do que nele em si, e o resultado seria melhor se tivessem focado ainda mais nisso.
O tipo de machismo que esta obra procura retratar é aquele velado, que “permite” que uma mulher seja grande, mas não maior que um homem. Na cena em que perguntam a Joan qual é sua ocupação, ela responde que é uma “criadora de reis”. Sua fala faz alusão ao ditado que diz que “por trás de um grande homem, existe sempre uma grande mulher”. Subvertendo este pensamento, podemos dizer que à frente de um filme de sucesso, existe uma atriz competente. Com alguns problemas pontuais, “A Esposa” não é um filme ruim, mas ganha muita força com o talento de sua protagonista.
Ficha Técnica
Ano: 2017
Duração: 100 min
Gênero: drama
Diretor: Björn Runge
Elenco: Glenn Close, Jonathan Pryce, Christian Slater, Max Irons, Annie Starke
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