Por Felipe Galeno
O clichê romântico do casal enfrentando algum tipo de doença física parece ter se tornado um dos favoritos de Hollywood nos últimos anos, sobretudo através das adaptações de romances adolescentes que se multiplicaram após o sucesso de “A Culpa é das Estrelas” em 2014. Um primeiro olhar para a sinopse de “Nosso Amor” pode dar a impressão de outro longa mais ou menos neste estilo, com o único diferencial estando na faixa etária mais avançada do casal, bem diferente dos jovens de 20 e poucos das outras produções. Não são necessários muitos minutos, porém, para que fique claro o quão distante o filme de Lisa Barros D’Sa e Glenn Leyburn está dos clichês românticos de sempre.
A narrativa acompanha um ano na vida de Joan (Lesley Manville) e Tom (Liam Neeson), que estão juntos há anos e têm suas vidas tranquilas abaladas quando a esposa é diagnosticada com um câncer de mama. Pode parecer a premissa de um melodrama afetado, mas a proposta do roteiro de Owen McCafferty é, na verdade, a de um retrato bem simples e honesto de um relacionamento. O texto dedica uma boa parte de sua duração para construir, através de momentos banais do dia-a-dia, o cotidiano pacato dos dois e, ao invés de olhar para isso com uma apatia distante, encontra nessa rotina singela o amor que o par de protagonistas nutre um pelo outro. Este pode não ser “de cinema”, mas nem por isso é menos verdadeiro. É um amor que permanece justamente graças ao contentamento com a simplicidade da vida.
Portanto, a obra acaba sendo fiel ao título original: “Ordinary Love” é sobre o caráter ordinário da vida e do romance, e o principal conflito aqui não tem a ver com a perseguição de algo além deste conforto, mas sim a luta pela sua preservação, sendo a doença não apenas uma ameaça física, mas um um catalisador para fragilização da estabilidade. Assim, sua trama devota-se à determinação de um casal em manter a sua tranquilidade mesmo quando exposto a circunstâncias excepcionais.
Dentro deste contexto, os trabalhos de Lesley Manville e Liam Neeson funcionam de forma excepcional na construção desses personagens tão distintos e parecidos ao mesmo tempo. Manville tem um pouco mais de tempo de tela, e aproveita cada minuto para dar um show em cena. Sua performance é empática sem precisar de exageros teatrais, doce e delicada em sua genuinidade. E, se a reputação no cinema de ação fez o público se esquecer de seu talento para papéis mais dramáticos, Neeson aproveita a chance que tem aqui para reafirmar sua destreza. Seu personagem tem reações ainda mais contidas e estoicas que a Joan de Manville, e o ator consegue conciliar essa serenidade com os sentimentos profundos com os quais Tom precisa lidar.
A normalidade de “Nosso Amor”, porém, tem um preço. Ironicamente, o trabalho da dupla Lisa Barros D’Sa e Glenn Leyburn, apesar de competente, soa “normal” demais. Os cineastas encontram certa graça no registro do cotidiano, e, na maior parte do tempo, sabem quando deixar o elenco brilhar. A questão é que, em alguns momentos, a direção acaba tomando uma mão convencional demais, utilizando um ou outro elemento mais apelativo que, mesmo que usado de forma discreta, soa um pouco deslocado para essa história específica. O terceiro ato é o que mais sente com essas escolhas e, por mais que o trabalho seja funcional, fica a sensação de que falta algo na mão da dupla para dar ainda mais destaque ao filme.
Não deixa de ser, ainda assim, uma experiência bem sensível a de assistir “Nosso Amor”. É, acima de tudo, um olhar sobre o amor que recusa o idealismo pomposo e o pessimismo aborrecido para encontrar na esperança honesta a sua motivação, e por isso já vale muito a pena.
Ficha Técnica
Ano: 2020
Duração: 92 min
Gênero: drama, romance
Direção: Lisa Barros D’Sa, Glenn Leyburn
Elenco:Liam Neeson, Lesley Manville, Esh Alladi