Por Marina Lordelo

Bo Burnham tem 29 anos e já lançou seu primeiro longa-metragem, “Oitava série” (2018), estrelado por Elsie Fisher, dubladora e atriz hollywoodiana no papel da adolescente Kayla. Acompanhando a tendência jovem de assumir a carreira de Youtuber, o diretor e também roteirista Burnham escolhe o dispositivo de auto-filmagem para apresentar a protagonista, que só é capaz de manifestar verbalmente o que sente e como pensa em superar sua timidez através do seu canal pouco visitado na plataforma de vídeo. Ela vai entrar para o Ensino Médio (High School) e é preciso reconstruir as expectativas do futuro, do mesmo jeito que criou no seu recente passado entre infância e a pré-adolescência, salvos numa cápsula do tempo.

Kayla poderia ser Olive (protagonista de “Pequena Miss Sunshine”), mas sem a autoconfiança expressiva da personagem de Michel Arndt. Seus corpos se assemelham e seus desafios de integração com a difícil comunidade adolescente as aproximam magneticamente. Mas se Arndt investe em um roteiro que circunda Olive de apoio e energia, Burnham não consegue atribuir a Kayla um suporte eficiente.

Ambientando-a em um sistema realista-contemporâneo, valorizando sua pele da puberdade, seu comportamento contido, sua aparente superficialidade em redes sociais, o roteirista retira da protagonista a leveza e o carinho da empatia com o espectador. E, indo adiante, adiciona uma carga dramática que não acompanha o desenvolvimento de um humor sofisticado que propõe a personagem.

Há alguns atributos interessantes, como apresentar em tela a perspectiva feminina da sexualidade na adolescência, geralmente representada pela insegurança dos garotos ou da resolutividade das meninas populares. Desta forma, Burnham oferece ao roteiro um comportamento mais próximo do real da maioria das garotas adolescentes. Esse fato ganha complexidade por assumir a ausência da mãe da protagonista e a dificuldade de dialogar com o pai – e então, compreende-se a internet como uma ferramenta de busca que esclarece os temas, mas negligencia os afetos.

A montagem também traz uma perspectiva curiosa de fusões, que dialoga com as diferentes texturas das imagens trazendo referências aos filmes das décadas de 1980/90 que exploravam com humor o tema da adolescência. A fotografia conservadora desperta então ao explorar o uso de diferentes dispositivos de imagem, por vezes diegéticos (dentro do próprio filme) modificando a textura, o tipo de enquadramento e a colorização final. 

A falha de pertencer ao ensino fundamental e a expectativa de pertencer ao ensino médio é a mensagem que o filme consegue evocar. Mas há tanta complexidade em Kayla e nos desejos de sobreviver a hostilidade escolar com sucesso, sempre presente na sociedade estadunidense, que é uma pena cercá-la de personagens outros, unidimensionais, que afetam a protagonista de forma a deixá-la em um tom único, desinteressante e apático. Desta forma, Bo Burnham precisaria afinar os instrumentos, sobretudo de roteiro, para garantir a Kayla a complexa simplicidade da jornada do adolescer. 

Ficha técnica

Ano: 2018

Duração: 93 min

Gênero:  Comédia, Drama

Direção: Bo Burnham

Elenco: Elsie Fisher, Josh Hamilton, Emily Robinson

Imagens:

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