Por Luciana Ramos
Daniel (Gael García Bernal) é um rapaz cigano que vive feliz em sua comunidade até ser responsabilizado por uma tragédia: a morte acidental e estúpida de Costel (Nahuel Pérez Biscayart). Expulso da comunidade, ele passa a trabalhar com Lucho (Mariano Santiago) em pequenos golpes, ao mesmo tempo uma punição imposta pelo irmão do morto e uma forma de expiação da culpa que carrega pelo incidente.
Repassando a maior parte do dinheiro à Maria (Alba Galocha), a viúva grávida de seu melhor amigo, ele não tem muitas alternativas e, por isso, refugia-se no Hotel Metrópole, um estabelecimento decadente governado pelo sádico gerente Michel (Karim Leklou) que, após entrar em contato com a história de um mafioso, deseja ser chamado de Umberto. O lugar sujo, pequeno e composto por figuras deprimentes, logo torna-se a representação visual do inferno astral do protagonista, absolutamente sem perspectivas.
O seu desespero é retratado por fortes inserções visuais, descritas como alucinações, que explicitam seu perfil psicológico: peixes podres amontoam-se nos corredores do hotel; no reflexo do espelho desgastado, ele enxerga o momento exato da queda do amigo. Construções como esta, alternadas por uma narrativa não-linear que aos poucos monta os pedaços da experiência de Daniel, ajudam a contextualizar não só o estado mental do personagem como oferecer maior substância à trama.
Esta caminha de forma gradual até o segundo ato, quando o rapaz conhece Francine (Marine Vacth), uma misteriosa jovem que passa a habitar o local depois de um acordo entre o governo francês e o dono do estabelecimento, o Sr. Ali (Abbes Zahmani): em troca dos “cuidados” (leia-se, submissão a maus-tratos por parte de Michel e nenhum interesse em realmente ajudá-la a se recompor), ele ganha uma recompensa mensal.
Este encontro de almas despedaçadas, um pela culpa e a outra pelo sofrimento de traumas envolvendo a perda de um filho, levam os dois a sonharem com uma fuga, como se o hotel, representação da escuridão emocional que habitam, já não fosse um fim em si mesmo, mas o começo de uma vida melhor – potencialmente. No entanto, nem Lucho nem o Sr. Ali estão dispostos a deixar isso acontecer, o que leva Daniel a buscar soluções viáveis para seus planos.
As passagens românticas, embora pouco contextualizadas (não parece ser a intenção do diretor aprofundar emocionalmente a personagem Francine), são as mais interessantes dos filmes, pois possibilitam a inserção da poesia na narrativa, tratamento típico dos filmes da Nouvelle Vague. De fato, passagens como a que o casal anda sem dinheiro pelas ruas de Paris para, em seguida, ser perseguido por um carro com os faróis voltados para a câmera, referenciam diretamente o movimento.
Essas pequenas construções, somadas, fornecem apelo ao material fílmico, mas a soma de diferentes escolhas estéticas, ao final, revela uma falta de coesão e, por isso, não surte o efeito esperado. O trabalho visual é ainda prejudicado pela narrativa, que falha em um ponto essencial para o envolvimento emocional do espectador: a simpatia pelos personagens.
Ainda que a jornada de Daniel seja absolutamente compreensível, a tarefa de identificar-se com ele – essencial para fins catárticos – mostra-se extremamente difícil por conta dos golpes e esquemas eu participa, parte da representação da vida cigana no filme. De fato, não há um personagem capaz de mostrar-se relacionável, o que leva ao filme ser contemplado com um certo distanciamento, algo extremamente prejudicial para a sua apreciação.
Ao fim, resta a admiração pelo trabalho de Gael García Bernal pela sua entrega (comum aos seus trabalhos), capaz de expressar pelo seu rosto toda a dor e infelicidade de seu personagem. Neste sentido, cabe também ressaltar a bela participação de Marine Vacth no longa que, embora pequena, mostra-se marcante pela forma com que a atriz compõe sua Francine.
“Se Você Soubesse” encontra-se disponível nas plataformas de VOD, como Apple TV e Google Play
Pôster
Ficha Técnica
Ano: 2017
Duração: 86 min
Gênero: drama
Direção: Joan Chemla
Elenco: Gael García Bernal, Marine Vacth, Nahuel Pérez Biscayart
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