Por Marina Lordelo
A Netflix tem investido cada vez mais em filmes e séries originais. Depois do sucesso de “Roma”, que angariou alguns Oscars para a distribuidora / produtora, o público tem valorizado ainda mais a plataforma de streaming. Para o bem e para o mal, a diversidade de conteúdos alcança públicos diversos em países variados, uma aposta consciente na quantidade de produtos. Algumas produções (sobretudo seriadas) têm se aproximado de conteúdos de ponta oferecidos pelas rivais da plataforma, como é o caso da HBO (com sucessos como “Game of Thrones” e “Big Little Lies”), da Amazon Prime Video (“Marvelous Mrs. Maisel” e “O Homem do Castelo Alto”), e também da Hulu (“O Conto da Aia”).
A Netflix lança então em 2019 a primeira temporada de “Sex Education”, uma série juvenil/adulta que dedica-se a falar sobre sexo na adolescência a partir de um ponto de vista ainda pouco apresentado pelos seriados. Ottis (Asa Butterfield) é um jovem que tem dificuldades de se relacionar com a própria sexualidade e isso se torna um pouco mais complexo por sua mãe ser uma terapeuta sexual. Os atendimentos de Jean (Gillian Anderson) acontecem na casa onde vivem, e os amigos de Otiis, Eric (Ncuti Gatwa) e Maeve (Emma Mackey), encontram no potencial “intelectual” do garoto uma oportunidade de descolar uns trocados no colégio – afinal, que adolescente não tem questões com sua sexualidade?
A série aposta no discurso, nos diálogos e na temática para criar um público abrangente. Ainda que haja um sintoma novelesco (no sentido narrativo), os oito episódios da primeira temporada dedicam-se a criar romances entre os personagens de maior destaque. O seu diferencial está então centrado no contexto criado para o desenvolvimento de suas nuances: enquanto o protagonista vive o extremo desconforto em poder falar sobre coisas demais com sua mãe (e acabar sendo analisado por ela), Eric não pode tratar das questões que envolvem a sua homossexualidade com a família conservadora que o acolhe. O gênero de comédia para situações adolescentes é então bem empregado, e diferente dos filmes mais famosos sobre a temática (“American Pie”, por exemplo), “Sex Education” avança no tratamento das questões de gênero, de opção sexual e racismo de forma habilidosa.
Ainda que centrado em um personagem masculino branco de classe média, algo absolutamente recorrente em produções desse tipo, há um balanço interessante em construir as personalidades femininas, que apresentam questões complexas, sobretudo Jean e Maeve – ambas são mulheres fortes e independentes, que questionam o sistema machista e apresentam posturas interessantes para combatê-lo, ainda que sejam humanas o suficiente para desenvolverem fraquezas e instabilidades aceitáveis para a construção de suas personagens. A homossexualidade e a bissexualidade são temas também equalizados com o centramento heteronormativo de Ottis, sendo capaz de colocar em questão uma série de preconceitos que envolvem a construção de suas premissas.
“Sex Education” consegue ser leve e intensa, divertida e doce, constrangedora e elucidativa. Um passo importante para alcançar sobretudo a juventude contida e conservadora que tem se formado espaço a fora, cheia de heranças preconceituosas e sintomáticas de uma geração anterior que muito se frustrou por precisar conter seus desejos e impulsos diversos.
Ficha Técnica
Ano: 2019
Número de Episódios: 8 (por temporada)
Nacionalidade: Inglaterra
Gênero: Comédia
Criadora: Laurie Nunn
Elenco: Asa Butterfield, Gillian Anderson, Ncuti Gatwa, Emma Mackey.