Um Espião Animal

Por Luciana Ramos

 

Lance Sterling (voz de Lázaro Ramos) é um habilidoso espião que sabe dosar inteligência e força física na captura de criminosos. Suas façanhas são amplamente reconhecidas no serviço secreto americano, o que o eleva ao status de ídolo – e o confere um ar arrogante de celebridade. Porém, tudo muda quando a falha em uma missão importante levanta suspeitas na agente Marcy (voz de Taís Araújo), que aciona a corregedoria para uma investigação sobre sua integridade.

Acuado diante das acusações, o reconhecível rosto de Lance torna-se a principal ameaça a sua segurança. Ele então resolve procurar Walter Beckett (voz de Guto Costa), um atrapalhado cientista que desenvolve gadgets de espionagem inusitados, como uma combinação quase letal de purpurina e gatinhos, além de um abraço inflável de unicórnio. Animado pela chance de recuperar seu emprego, o jovem mal tem tempo de apresentar sua última invenção de camuflagem antes que Lance tome um líquido misterioso e se torne…um pombo.

O desespero toma conta – e o espião se sente à vontade para expressar seu descontentamento a cada momento – mas o disfarce acaba sendo útil na busca da pessoa que vem usado seu rosto para cometer crimes. Walter o acompanha a fim de auxiliá-lo em coisas simples como travessias de carro e aperto de botões, levando junto sua pombinha de estimação, Amore, e mais dois pombos que logo se juntam ao grupo.

Com uma premissa simples, porém bem arquitetada, “Um Espião Animal” aposta nas desventuras que seu protagonista enfrenta diante das novas limitações físicas, que devem ser contornadas com sagacidade e propensão à improvisação. Trabalhando a partir do famoso conceito de opostos cômicos, o roteiro explora as diferenças entre os dois personagens principais para expor o que cada um tem de melhor e, ao final, como esperado, apresentar a Lance a oportunidade de crescimento pessoal, vinda tanto da apreciação genuína das qualidades de Walter quanto da decorrente suavização do seu ego inflado.

Menos voltada para a comicidade da vida de pombo, ainda que explore curiosidades do comportamento de bando, o filme aposta em sequências complexas de ação para conquistar crianças maiores (na faixa dos 06 aos 10 anos), usando a movimentação de câmera como instrumento para explorar a capacidade da equipe de animação em construir cenários ricos em detalhes, por vezes concentrando-se em múltiplos focos de ação no mesmo enquadramento.

Dispensando quase totalmente muletas narrativas conhecidas do público infantil, como a apresentação de exaustivos números musicais (sucesso entre os menores), a produção da Blue Sky tem como principal trunfo a capacidade de se moldar a partir da personalidade dos seus principais dubladores: aos familiarizados com Will Smith e Tom Holland, é muito fácil reconhecer seus trejeitos nas faces animadas de Lance e Walter.

Esta característica torna imensamente mais difícil o processo de dublagem, mas Lázaro Ramos, Guto Costa e Taís Araújo conseguem imprimir personalidade às suas vozes, moldando os personagens em um invólucro novo sem desrespeitar as pequenas entonações das dublagens originais.

Falta a “Um Espião Animal” maior aprofundamento de alguns temas e personagens – como uma contextualização melhor de Marcy ou maior exploração das características dos pombos – mas, em termos gerais, o filme satisfaz sua premissa de fornecer entretenimento de qualidade à crianças maiores, que exigem maior complexidade narrativa e visual.

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