Por Melissa Vassalli

 

O Show de Truman é um filme que já nasceu clássico. Quando ele estreou, vinte anos atrás, reality shows ainda não eram comuns nas grades dos canais de televisão, mas não demoraria muito para que se tornassem um fenômeno. Se na época de seu lançamento o longa tinha um caráter especulativo sobre as mudanças que a mídia traria à vida das pessoas, afetando relacionamentos e hábitos de consumo, hoje ele soa mais atual do que nunca.

No filme, Jim Carrey interpreta Truman Burbank, um pacato vendedor de seguros que, sem saber, teve sua vida inteira monitorada por câmeras de televisão. Todas as pessoas com quem convive, incluindo seus familiares, são atores contratados, e Seahaven, a cidade onde eles moram, é um grande estúdio construído para O Show de Truman – o programa dentro do filme. Por quase trinta anos, Truman não teve dúvidas sobre sua realidade, até que algumas coisas estranhas acontecem e ele passa a desconfiar de que há algo errado em sua vida.

O longa é ao mesmo tempo irônico e melancólico, dotado de humor e melodrama. Alguém já deve ter dito que Jim Carrey, apesar de ter inúmeras comédias em sua carreira, é também um ótimo ator dramático, e aqui ele pôde explorar as duas vertentes. Ele, assim como os outros atores, atua em tom acima, o que evidencia o aspecto teatral daquele universo. Ainda em 1998, o roteiro do filme foi publicado em um livro, pela editora Manole, que trazia também um depoimento do roteirista Andrew Niccol, que disse acreditar que a realidade do filme é igual a nossa, pois estamos sempre interpretando personagens. E às vezes isso ocorre exageradamente.

A obra trabalha com o fascínio que os telespectadores possuem pelas narrativas ditas reais. Elas trazem a possibilidade de nos reconhecermos no outro enquanto tentamos encontrar algum sentido para nossas próprias vidas. Não é à toa que, no filme, Truman tem fãs pelo planeta inteiro. E nós ficamos igualmente encantados pelo mundo perfeito e sincronizado em que o personagem vive. É quase tentador o desejo de fazer parte dele, ainda que saibamos que tudo faz parte de uma mentira.

 

 

As composições visuais do diretor Peter Weir se destacam. As casas de madeira, com varandas próximas à rua, e os figurinos que parecem trajes da década de 1940, tentam simular a América de um tempo passado, justamente para denotar que Seahaven é o melhor lugar para se viver – e Truman precisava ser constantemente lembrado disso para não ultrapassar os limites da cidade, o que acabaria com o show.

Mas a mesma ordem que nos fascina é também a mesma que oprime, pois ninguém pode viver eternamente em um mundo sem espontaneidade. Retornando ao filme vinte anos depois, é curioso observar que, ainda que tenha em seus trinta anos pregressos o protagonista tenha ignorado a verdade sobre mundo em que vivia, ele passa a maior parte dos 100 min do filme já consciente de que há algo errado e tentando reencontrar a única pessoa com quem teve uma relação sincera, uma atriz que tentou lhe contar a verdade e por isso foi expulsa do programa.

É significativo que, embora o filme caminhe para um final esperado pelo público, com Truman reencontrando a citada mulher, a cena mais aguardada não seja exibida. Quando ele atravessa a porta que separava Seahaven do resto do mundo, o programa e o filme acabam. Só nos resta imaginar.

 

Pôster

 

 

Ficha Técnica

 

Ano: 1998

Duração: 103 min

Gênero: comédia dramática

Diretor: Peter Weir

Elenco: Jim Carrey, Ed Harris, Laura Linney, Natascha McElhone, Noah Emmerich

 

Trailer:

 

Imagens:

 

 

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